Rui Teixeira, dirigente do PCP Açores

Inicio hoje o primeiro de dois artigos de opinião sobre a chamada inteligência artificial. O de hoje será sobre os seus efeitos, o da próxima semana será sobre é realmente possível que a inteligência seja artificial.

A Humanidade está ligada, desde o seu início, à criação de instrumentos e de tecnologias que permitam melhor sobreviver. Assim foi com o fogo, a roda ou o arado, entre tantas outras. No século XIX, as máquinas modernas permitiram um novo patamar. Estas máquinas, criação da Humanidade, permitiram níveis nunca vistos de produção. Mas a Humanidade não foi capaz de acabar com a fome, apesar de, pela primeira vez na História, produzir o dobro dos alimentos necessários para toda a população mundial. Por isso, a capacidade introduzida pelas máquinas modernas não reverteu de forma igual, justa ou equilibrada para toda a Humanidade. Favoreceu, em primeiro lugar, a acumulação de riqueza.

No século XX, a informática abriu uma nova era, que continuou neste século. Nunca a tecnologia tinha evoluído a este ritmo, de tal forma que transforma as relações sociais e económicas a velocidades que, há 30 anos, eram impensáveis! Recentemente, surgiram desenvolvimentos importantes no campo da chamada inteligência artificial. Esta ferramenta tem, sem dúvida, um potencial enorme. Resta saber com que finalidades será utilizada.

É precisamente neste ponto que começam as contradições: este potencial pode ser utilizado a favor do desenvolvimento da Humanidade ou a favor das desigualdades, acelerando ainda mais a acumulação de riqueza. Recentemente foi notícia que 45% da riqueza mundial está concentrada nas mãos dos 1% mais ricos. Isso significa que cada indivíduo que pertence a essa elite mundial acumula cerca de 80 vezes mais riqueza do que os restantes 99%. Ou, visto de outra forma, traduz-se, ao fim de um ano, num rendimento médio per capita superior a meio milhão de euros, enquanto que os restantes 99% contam com um rendimento médio de, apenas, 6 400 €.

Esta acumulação de riqueza é inseparável das tecnologias que foram surgindo desde o século XIX. Como nos ensina a História, as máquinas foram aproveitadas para esta desigualdade brutal, em vez de permitirem, a todos, a qualidade de vida que seria possível no século XXI. Quando uma máquina produz tanto quanto 10 indivíduos, 9 deles são lançados para o desemprego! Uma solução ditada pela racionalidade seria a redução do tempo de trabalho. A ganância do lucro prefere o desemprego.

É neste contexto, em que as tecnologias são utilizadas para alargar as desigualdades, que surge a chamada inteligência artificial. Não foi introduzida nenhuma modificação na nossa organização social e económica. Continuamos a viver num sistema estruturado para a acumulação cada vez mais rápida dos lucros. Daí que todos os estudos científicos sobre os efeitos desta nova tecnologia sejam unanimes: mais desemprego e mais desigualdades.

Tal como acontece com todas as tecnologias, a chamada inteligência artificial poderá vir a ser colocada ao serviço do desenvolvimento social e do equilíbrio ambiental. Mas isso exige um sistema económico radicalmente diferente daquele em que nos encontramos. Exige um sistema económico a pensar nas pessoas, e não na acumulação brutal de lucros. Que é urgente construir, ao nível de todo o planeta. É que, no fim de contas, é toda a sobrevivência da Humanidade e do próprio planeta, tal como o conhecemos, que está em causa!

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