Continuando a caminhar até aos 50 anos da Revolução de Abril, esta semana abordarei uma conquista de Abril muito especial: a Autonomia Regional. As leis não são neutras, nem os regimes políticos. Assumem um lado. O da Autonomia Regional é o da defesa do interesse dos Açorianos. E não é por acaso que surge após a Revolução de Abril.
Como se sabe, até ao derrube do fascismo, para o poder político, pouco importavam os Açores e a Madeira. O sentimento geral de quem cá vivia era que sobrevivia por conta própria – e não andava longe da verdade. Para a ditadura, nós não tínhamos capacidade para decidir – aliás, até era perigoso que os Açorianos de então pudessem gerir a sua vida coletiva. E este não era caso isolado: outras vastas parcelas do território nacional eram províncias que o poder político e o grande poder económico votavam ao atraso.
Por isso mesmo, a Autonomia Regional surge como exigência dos Açorianos e dos Madeirenses. O princípio por trás da Autonomia é que ninguém nos pode governar tão bem quanto nós próprios, o seu objetivo central era o desenvolvimento e a melhoria da vida nos arquipélagos. E só isso já diz muito. É que desde o princípio que a própria Revolução de Abril assumiu um lado: dos mais frágeis, dos trabalhadores, dos que, trabalhando todos os dias, eram pobres. Dos esquecidos pelo poder político. E posicionou-se contra o poder político e económico centralista e absoluto, aquele que afogava a maioria do povo para enriquecer uma minoria à conta deste. Desde o princípio que Abril assumiu que a Democracia devia ser participada e partilhada.
É assim natural a instituição da Região Autónoma dos Açores na Constituição da República de 1976, a primeira em Democracia. Que também assumiu o direito à Saúde, à Educação, ao trabalho digno e com direitos. A essência da Autonomia Regional está ligada a dois objetivos essenciais da Revolução de Abril: Democratizar e Desenvolver.
É certo que todos os regimes podem e devem ser melhorados. Mas passados quase 50 anos da Revolução de Abril, parece que se inverteram as prioridades na Assembleia Regional. Também há perguntas incómodas que ficam sempre de fora. Há factos que demonstram bem o desrespeito pela natureza do regime autonómico, pelos objetivos de desenvolvimento equilibrado e sustentado da Região. Perdidos no meio das suas contradições, o governo e os deputados regionais distraem-se e esquecem-se da comida que falta nas mesas açorianas, dos salários muito baixos, do custo insuportável da habitação. Esquecem-se da falta de médicos de família e dos cuidados adiados. Aceitam que a verba que falta no serviço público de saúde seja transferida para o negócio privado da doença. Ignoram a destruição progressiva da nossa produção, da agricultura e das pescas.
A Autonomia Regional é, sem dúvida, um instrumento essencial para a nossa vida coletiva. Infelizmente, não tem sido utilizada para o nosso desenvolvimento, para melhorar a vida dos Açorianos, para responder aos desafios que enfrentamos no presente. As propostas que, recentemente, a Assembleia Regional aprovou nem promovem o debate em torno destes e de outros problemas, nem contribuem para os resolver. E diria até mais: a maioria daquelas propostas ignora, exatamente, a essência da nossa Autonomia. É que esta Autonomia não é neutra, é de Abril, ligada às suas profundas transformações: Desenvolver e Democratizar, assumindo que o poder pertence, sempre, ao Povo!