Uma missão arqueológica, a decorrer em Santa Maria, Açores, tem permitido a prospeção de um forno de olaria e identificar várias peças típicas daquela ilha, como alguidares e fragmentos de talhões, permitindo perceber a olaria açoriana, foi hoje revelado.
“Ainda estamos em níveis superficiais. Ainda não chegámos à base do forno. E o que temos identificado é muita loiça típica de Santa Maria, muitos alguidares, fragmentos de talhões, alguns deles com defeito de produção que indicam que, nas redondezas, quando aquele forno já não estava a funcionar, ainda funcionavam outras olarias e outros fornos”, explicou o investigador João Araújo, em declarações à agência Lusa.
Esta missão arqueológica, apoiada pelo município de Vila do Porto, que está a decorrer desde 01 de setembro e termina no sábado, prevê a recolha de amostras de argila e de cerâmica arqueológica e a continuação da escavação do forno de olaria existente na rua dos Oleiros, em Santa Maria.
A missão enquadra-se no âmbito de dois projetos: o “CERIBAM: Arqueologia y Arqueometria del Expansionismo Atlantico Ibérico en el Norte de Africa y las islas de la Macaronesia (siglos XV-XVI) – Ceramica, Poblamiento y Comercio”, financiado pelo Ministerio de Ciencia e Innovacíon de Espanha), e o projeto de doutoramento de João Gonçalves Araújo intitulado “A olaria açoriana: uma abordagem arqueológica à sua produção e consumo nos séculos XVI a XVIII”, financiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT).
A equipa é constituída por João Araújo, Bolseiro de Doutoramento FCT e investigador da Universidade dos Açores, André Teixeira, professor do Departamento de História e investigador na Universidade Nova de Lisboa, Javier G. Iñañez, professor do Departamento de Geografia, Pré-História e Arqueologia e investigador da Universidade do País Basco e Joana Bento Torres, doutoranda e investigadora da Universidade Nova de Lisboa.
Além de permitir perceber as características da olaria açoriana e, no caso concreto de Santa Maria, esse estudo da cerâmica arqueológica consegue também dar a “conhecer aspetos importantes do quotidiano das populações”, segundo realçou João Araújo.
Uma das metas da missão é a escavação de um forno de olaria na rua dos Oleiros em Vila do Porto, que já foi alvo de uma primeira escavação em 2013.
“O objetivo dessa campanha é aprofundar essa escavação em articulação com os arqueólogos que participaram nas primeiras campanhas em 2013. Pretende-se conhecer esta estrutura de produção de loiça porque restam muito poucas no arquipélago. Se este não é o único, é um dos poucos fornos de olaria que ainda existem”, acrescentou.
João Araújo assinalou que, a partir do estudo da cerâmica, o objetivo é chegar a questões como “o início do povoamento do arquipélago, o abastecimento das ilhas”, mas também perceber a loiça que era produzida quando as pessoas acabaram por se fixar” nos Açores.
“O conhecimento do forno de olaria permitirá ter também numa perspetiva do urbanismo de Vila do Porto”, detalhou ainda.
De acordo com o investigador, em causa está “um processo moroso” que vai implicar mais trabalhos futuros de escavação.
Por agora já foram identificadas várias peças típicas da ilha, algumas das quais “com defeitos de produção”, umas “mal cozidas, outras que se partiram no processo de cozedura” e que atestam a localização, nas redondezas, de produção de cerâmica.
“Em Santa Maria produzia-se loiça que se exportava para as outras ilhas. Também era extraído barro que era enviado para as outras ilhas, em concreto para olarias de Vila Franca do Campo, em São Miguel, e de Angra do Heroísmo, na Terceira, explicou o investigador à Lusa.
João Araújo adiantou também que existe documentação atestando a expedição de loiça de Santa Maria, como complemento de carga.
“Os Açores eram um importante centro produtor de cereais que abastecia a Madeira, as Canárias, as cidades portuguesas que tinham sido conquistadas no Norte de África e complementarmente ia alguma loiça”, disse.
Para o futuro será planeada uma nova campanha, por forma a dar continuidade às escavações e, assim, alcançar a base do forno e conseguir datar o período da sua construção e de laboração
Quanto às peças agora localizadas serão limpas e registadas, e o espólio vai ficar à guarda do Museu de Santa Maria, com vista a eventuais futuras exposições.
Para a autarquia de Vila do Porto, o apoio a esta iniciativa “é mais uma forma de preservar e valorizar o património existente, promovendo conhecimento científico sobre a história relacionada com a cerâmica e olaria no concelho”, segundo é referido numa nota de imprensa.