A maioria dos governos minoritários em Portugal, seis em oito, não cumpriu o seu mandato de quatro anos até ao fim.

Em democracia, apenas dois executivos sem maioria conseguiram estar no poder e ambos do PS – os executivos de António Guterres (1995-1999) e António Costa (2011-2015).

Em quase 50 anos de democracia, houve governos de geometria variável – maiorias absolutas de um só partido, em coligação, alianças PS/CDS, um Bloco Central PS/PSD.

E em matéria de viabilização de orçamentos, há para todos os gostos: até o PCP de Álvaro Cunhal chegou a abster-se num orçamento do PS de Mário Soares, em 1976. Para a história ficará também a “abstenção violenta” do PS, sob a liderança de António José Seguro, a um orçamento do Governo PSD/CDS.

Instabilidade governativa após o 25 de Abril

Os primeiros anos de democracia, desde as eleições legislativas, em 1976, foram caracterizados por grande instabilidade governativa: nenhum dos governos conseguiu cumprir o seu mandato, apesar de cinco deles (PS/CDS, Aliança Democrática e Bloco Central – PS/PSD) terem governado com maioria no parlamento.

Dois anos depois da Revolução dos Cravos, em 1976, as primeiras legislativas em democracia ditaram a vitória, com 34,9% e 107 dos 250 deputados, ao PS liderado por Mário Soares, que foi primeiro-ministro. Em vez de quatro anos, o I Governo Constitucional durou metade e caiu com o chumbo de uma moção de confiança, em que pesaram os votos do PCP.

Mário Soares conseguiu ver aprovado o Orçamento do Estado de 1977 com a abstenção de partidos da oposição, o PPD de Sá Carneiro, o PCP de Álvaro Cunhal e o CDS de Diogo Freitas do Amaral. Votaram contra Acácio Barreiros, da UDP, mais tarde deputado do PS, e dois dissidentes dos socialistas – Aires Rodrigues e Carmelinda Pereira, que fundaram um partido já extinto, o POUS (Partido Operário de Unidade Socialista).

O II Governo Constitucional também não durou muito tempo, mas por divergências entre os dois partidos que formaram uma “aliança” pouco usual – o PS, à esquerda, e o CDS, à direita.

Três governos de iniciativa presidencial

Com uma Constituição que permitia (ao contrário de hoje) governos de iniciativa presidencial, seguiram-se três executivos impulsionados por Ramalho Eanes, o coronel do 25 de Novembro eleito Presidente da República em 1976.

Em agosto de 1978, tomou posse o Governo chefiado por Nobre da Costa, mas durou pouco menos de quatro meses, por ter sido rejeitado, no parlamento, o seu programa.

Carlos Mota Pinto foi o primeiro-ministro do IV Governo, também de iniciativa presidencial, que durou menos de um ano e caiu devido ao Orçamento de 1979. Uma primeira versão foi chumbada devido à pretensão de pôr fim ao subsídio de Natal. Passou à segunda, mas como as Grandes Opções do Plano foram rejeitadas, Mota Pinto demitiu-se.

Seguiu-se um terceiro executivo que a ex-ministra dos Assuntos Sociais Maria de Lurdes Pintasilgo chefiou por 100 dias. Foi a primeira e única vez que uma mulher foi primeira-ministra em Portugal, em 1980.

Maioria à direita, com a Aliança Democrática

Os anos seguintes foram de maioria absoluta de direita, com os executivos da Aliança Democrática (AD), saído das eleições de 1979, primeiro com Sá Carneiro (PSD) como primeiro-ministro e Freitas do Amaral (CDS) como vice-primeiro-ministro, depois com Pinto Balsemão (PSD), chefe do Governo até 1983.

Bloco Central durou dois anos e meio

Nesse ano, o país vai de novo a votos, ganha o PS de Mário Soares, que, sem maioria, opta por um acordo com o segundo maior partido, o PSD. Foi a única vez que os dois maiores partidos se entenderam para o Governo, um acordo que ficou para a história como Bloco Central.

Com a morte de Mota Pinto, o PSD elege um novo líder, Cavaco Silva, em 1985, que discorda do Bloco Central, rompe o acordo com o PS e abre caminho a um novo ciclo político de direita.

Nessas legislativas, o PSD teve 29,9% e, em minoria, o primeiro executivo de Cavaco teve que enfrentar um novo partido, o Partido Renovador Democrático (PRD), eanista, inspirado no Presidente da República, Ramalho Eanes, com 45 deputados e 17,9% dos votos.

O primeiro orçamento do executivo de Cavaco Silva foi aprovado graças à abstenção do PRD e do PS e ao voto favorável do CDS e o segundo já teve o voto contra da bancada socialista, beneficiando novamente da abstenção dos renovadores.

O apoio a Cavaco Silva deu lugar à censura. Em abril de 1987, o PRD apresentou uma moção de censura que uniu aquele partido e os partidos de esquerda. O motivo foi uma planeada visita de deputados à União Soviética, que incluía a Estónia, cuja anexação pela URSS não era reconhecida pelo Estado português.

A esquerda ainda tentou apresentar uma solução de governo, mas Mário Soares, Presidente da República, recusou e antecipou as eleições, ganhas pelo PSD, com 50,2%.

Foi preciso esperar 13 anos desde o 25 de Abril para ver um Governo cumprir quatro anos de mandato, que se transformaram em oito depois de o PSD voltar a ganhar com mais de 50,6% em 1991. E Cavaco Silva governou até 1996.

Guterres ganha, mas sem maioria absoluta

António Guterres, do PS, sucede a Cavaco Silva. Sem maioria absoluta, o executivo socialista negociou sucessivos orçamentos e completou o mandato, primeiro com o CDS, depois com os deputados do PSD dos Açores e da Madeira.

Em 1996, Marcelo Rebelo de Sousa é líder do PSD e deixou passar os orçamentos de 1997 a 1999, em nome do interesse nacional numa fase em que Portugal se preparava para aderir à moeda única.

Os portugueses vão de novo a votos e em 1999 as urnas deram um resultaram inédito: um empate 115-115 entre o PS e a oposição, de esquerda e direita.

António Guterres opta, então, por negociações à direita e o orçamento de 2000 passou com abstenção do CDS, que exigiu aumentos das pensões.

O Orçamento limiano, último de Guterres

No ano seguinte, e com o PSD já liderado por Durão Barroso, os socialistas fizeram mais uma originalidade – o orçamento limiano.

O Governo negociou com um deputado, Daniel Campelo, do CDS, que chegou a fazer uma greve de fome no parlamento contra o encerramento de uma fábrica de queijo em Ponte de Lima. Campelo violou a disciplina de voto do seu partido e ajudou a aprovar o orçamento.

Guterres demitiu-se após um mau resultado do PS nas autárquicas, para “evitar o pântano” político, e seguiram-se, a partir de 2002, os governos de PSD/CDS com Durão Barroso, que saiu para ser presidente da Comissão Europeia, deixando o executivo a Pedro Santana Lopes que não cumpriu o mandato.

Sócrates e a abstenção negociada com PSD

Pela primeira vez, em 2005, o PS, com José Sócrates, governa com maioria absoluta, mas perde-a quatro anos depois, ficando em minoria que ditou a sua queda, em 2011, já depois da crise que levou o país a pedir a intervenção da ‘troika’.

Mas antes, e em plena crise, o PSD, com Manuela Ferreira Leite na liderança, viabilizou, pela abstenção os orçamentos de Sócrates. O mesmo aconteceu com Pedro Passos Coelho em 2010, fruto de uma negociação direta entre o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, e um antigo ministro da pasta, Eduardo Catroga, pelo PSD.

Seguem-se quatro anos de maioria de direita PSD/CDS, com Pedro Passos Coelho, medidas de austeridade rigorosas, com cortes salariais. Em 2011, com Passos no Governo, o líder do PS, António José Seguro, viabilizou um orçamento com uma “abstenção violenta”. Cumprida a legislatura, a coligação Portugal à Frente (PAF) venceu as eleições, mas a ficou sem maioria no parlamento.

Governo PSD/CDS cai, ganha maioria de esquerda na AR

Passos Coelho ainda formou governo, mas o PS, de António Costa, com um acordo parlamentar com o Bloco de Esquerda, PCP e PEV chumbam o programa de Governo e são os socialistas que formam o executivo minoritário. Apelidado de “geringonça”, durou quatro anos, de 2015 a 2019, quando o PS ganha as eleições, sem maioria.

Da ‘geringonça’ à maioria absoluta que caiu

O equilibro foi instável nesta segunda fase de “geringonça” sem papéis assinados e o chumbo do Orçamento de 2022 ditou as eleições antecipadas que deram uma maioria absoluta aos socialistas.

Uma maioria absoluta que durou pouco tempo. Em 07 de novembro, António Costa demitiu-se por o seu nome surgir associado a um processo judicial que investiga casos de alegada corrupção e tráfico de influências em negócios de lítio, hidrogénio verde e um centro de dados em Sines.

Só Cavaco e Sócrates concluíram mandatos

No período democrático, foram seis Governos em Portugal com maioria absoluta, quatro liderados pelo PSD, (dois com a Aliança Democrática liderada por Sá Carneiro, em 1979 e 1980, e dois com Cavaco Silva, em 1987 e 1991) e dois pelo PS (um com José Sócrates, em 2005, e outro com António Costa, em 2022).

Apenas Cavaco Silva e José Sócrates conseguiram concluir os seus mandatos.

 

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