A diáspora açoriana é muito forte, o que fica expresso ao comparar os açorianos residentes no arquipélago, cerca de 250 mil, com o número de açorianos emigrantes ou descendentes – 1,5 milhões, particularmente nos Estados Unidos ou no Canadá.
O Observatório da Emigração apontava, em 2011, que, do total de 4,5 milhões de portugueses residentes no estrangeiro, cerca de 1,5 milhões eram emigrantes açorianos e seus descendentes.
Esta influência verifica-se na própria vida da Igreja Católica, com os açorianos a levaram para as terras de acolhimento as suas tradições religiosas.
“O açoriano é fantástico. Eu fui a Turlock, no Vale de São Joaquim, São Francisco, a uma das festas que lá há. Fiquei espantado. Eu estava nos Açores. A forma como viviam as festas, as procissões, os cortejos de animais, os carros feitos por eles, todos a guincharem, como era antigamente nos Açores…”, diz o bispo de Angra em entrevista conjunta à agência Lusa e à agência Ecclesia.
Segundo o prelado, “os açorianos transportam os seus costumes, as suas tradições, sobretudo as suas festas e religiosidade popular para as comunidades onde estão”.
E a diáspora considera o bispo de Angra o seu bispo?
“É muito interessante esse aspeto, porque eu já tenho mais quatro ou cinco convites para ir a estas dioceses da diáspora. Eles têm muito brio em levar os seus padres dos Açores, levar a sua cultura aos lugares onde estão”, diz o bispo Armando Esteves Domingues, acrescentando que “os sacerdotes dos Açores, muitos deles, todos os anos vão a uma das festas, ou às Bermudas, ao Canadá, ou aos diversos lugares dos Estados Unidos. E aí vão fazer as suas pregações, participar nas festas”.
Os emigrantes açorianos “ficam felicíssimos e todos tentam levar alguém dos Açores. E o bispo também é a mesma coisa. Vamos também como sinal desta unidade”.
Por outro lado, o Igreja Açores, portal que funciona como agência de comunicação da própria diocese, vê muitos dos conteúdos que produz serem consumidos pelos açorianos no exterior.
“Há uma grande ligação, aquilo que se escreve no Igreja Açores tem mais leitores fora, mas de longe (…) do que tem nos Açores”, reconhece o bispo, sublinhando que “os Açores têm uma característica única em Portugal, a forma como a religiosidade inculturou, talvez porque [se trata de] ilhas isoladas, perdidas no meio do oceano, com pouca, quase nenhuma ligação mesmo ao continente”.
“Este ser ilha, ser pequeno, estar isolado, como que mais facilmente levou a que as coisas inculturassem e, percebidas de uma forma ou de outra, tornaram-se quase iguais em todo o lado”, explica o prelado, adiantando que “a primeira de todas é o Espírito Santo, que é transversal às ilhas todas”.
“As festas do Divino Espírito Santo são uma coisa espantosa, como em todos os cantos há freguesias, paróquias, que têm, se calhar, uns dez impérios, que são irmandades que ali desenvolvem atividade à volta do Espírito Santo, que não é só a coroação, mas que são obras de caridade, distribuição de bens”, adianta, não esquecendo “as romarias [que] têm uma força, impacto”, que “todos sentem que (…) é um património que identifica, que faz parte da identidade do povo açoriano”.
Com a diocese à beira dos 500 anos, que se comemoram em 2034, Armando Esteves Domingues alerta para o risco decorrente da força desta religiosidade popular.
“Claro que isto também pode criar alguma dificuldade, porque quando a religiosidade é meramente popular, leva a entender que ali se resume tudo e que se esgota tudo, que não é necessário haver alguma formação, alguma leitura (…). Há aqui pastoralmente caminho que se pode avançar e isto pode levar a que os grandes objetivos da Igreja, que é a evangelização, que é esta diaconia, o serviço aos pobres, o vencer e o fazer com que se ultrapassem estas situações de injustiça social” se concretizem.
Neste contexto, a diocese apresentou um itinerário pastoral para os próximos dois anos até ao jubileu da Esperança, com vista a preparar os planos plurianuais até aos 500 anos da diocese.
“Pretendemos que seja como que um tempo zero, de mais auscultação, mas não é ouvir por ouvir. Nós já fizemos os diagnósticos todos. Houve um percurso também na diocese, muito profundo, quase começou até ainda antes de o Papa ter pedido este percurso sinodal em função do sínodo universal”, diz o bispo de Angra à Lusa e à Ecclesia, explicando que estes dois anos até ao jubileu vai ser vivido “em laboratórios – da sinodalidade, da fraternidade e da esperança”.
O ambiente sinodal vivido pela Igreja Católica a nível universal vai estar bem marcado neste futuro próximo da Igreja açoriana.
Aliás, o bispo é bastante convicto quando afirma que este movimento já não vai parar na Igreja. “E não digo só Igreja universal, mas a Igreja nas suas expressões locais”.
“E não, porquê? Porque o que se está a criar não são respostas. Estamos a criar um estilo de ser Igreja”, diz Armando Esteves Domingues, sublinhando que, quando “cardeais da cúria e outros que tais, bispos do mundo inteiro, com meninas da África e da Ásia e da América, religiosas ou leigas, religiosos ou leigos se sentam à mesma mesa e onde cada um tem o mesmo tempo para falar e o mesmo direito de se expressar e o mesmo direito ao votar, isto cria um estilo que nunca mais vai parar a Igreja”.
“É evidente que há resistências, há pessoas que não simpatizam muito com o método sinodal. É muito mais fácil ter uma liturgia certinha, diretrizes muito verticais a que todos obedeçam, mas que não forma para ser, para agir, para desenvolver, onde todos parece que estão muito unidinhos, mas indiferentes e apenas a procurar esquecer o que o outro diz”, conclui.