Rui Teixeira, dirigente do PCP Açores

Este será o segundo artigo de opinião dedicado à chamada inteligência artificial. Na semana passada, abordei o aumento das desigualdades sociais e do desemprego que podemos esperar da introdução massiva desta tecnologia no sistema económico em que vivemos. No fundo, trata-se do mesmo resultado obtido com a introdução de todas as tecnologias, e que é consequência da competição cada vez mais selvagem, intrínseca a esse mesmo sistema económico. Assim, dificilmente surpreenderá a substituição de trabalhadores, em inúmeras profissões, por máquinas equipadas com esta nova tecnologia!

Poderá parecer estranho que me refira a esta tecnologia como “a chamada inteligência artificial”. Efetivamente, trata-se do nome que lhe foi atribuído… Justifica-se mesmo lançar essa questão? Em minha opinião, sim! Esta é, realmente, uma tecnologia com potenciais enormes. Eu destacaria um: a capacidade para apresentar respostas adequadas a questões ou a desafios muito complexos. Perguntas ou problemas que, até agora, apenas seres humanos podiam responder. Mas isso não significa que adjetivá-la como inteligência artificial seja rigoroso!

A inteligência humana, tal como a dos restantes seres vivos, é o resultado da evolução e da necessidade para sobreviver. É aquilo que nos permite aprender com os erros – aliás, a nossa inteligência desenvolve-se com os erros que cometemos! É a inteligência que nos permite fazer escolhas, apreciar música, observar aqueles que amamos. É a inteligência que nos permite o pensamento ético, participar na sociedade em que nos inserimos, seguir Engenharia, Medicina, Direito, Belas Artes, que nos permite sentir as injustiças e lutar contra elas.

Os exemplos a dar seriam milhares. Cada um destes não está ao alcance da chamada inteligência artificial, por uma simples razão: o seu potencial resulta da informação e da programação que lhes foram fornecidas. Ou seja, nada disto está ao seu alcance, a não ser que tenha sido construída com esse objetivo… Por isso, não terá capacidade para fazer escolhas fora da sua programação! No fundo, aquilo que chamamos, vulgarmente, de livre arbítrio não estaráao alcance da chamada inteligência artificial!

Nada disto a desvaloriza. Esta é, sem dúvida, uma ferramenta que, em breve, estará inserida em praticamente todos os ramos da nossa sociedade – quer queiramos, quer não. Mas o ser humano é insubstituível e a inteligência ainda é propriedade dos seres vivos. Por isso, acho que esta tecnologia seria melhor designada demotor de análise de informação. No fundo, é isso que ela faz, com uma eficácia extraordinária! Mas aquilo que se conhece sobre esta tecnologia permite adivinhar que este nome é uma falsa humanização. Destina-se a que, mais facilmente, aceitemos a substituição de trabalhadores bancários ou dos call centers, de médicos, professores, jornalistas, e advogados, detécnicos de museu e trabalhadores agrícolas, entre tantos outros! Ironia das ironias, as profissões mais ameaçadas são, precisamente, as que exigem a inteligência humana…

É certo que vou ser obrigado a aceitar este nome, de tão implantado está. Mas, enquanto ser humano, posso manter esta minha discordância… E há uma razão central, para além das que já referi. É que as máquinas equipadas com inteligência artificial não sentirão a injustiça que virá com a substituição de homens e mulheres nos seus empregos, nem poderão decidir lutar contra o aumento das desigualdades e da pobreza que daí resultará. No fundo, a inteligência artificial ainda é incapaz de optar por um de dois lados incompatíveis: a acumulação irracional de riqueza ou, no polo oposto, o equilíbrio social, económico e ambiental. E, se há coisa que a pandemia nos mostrou, é que o contacto humano é essencial para cada um de nós e para uma sociedade que se pretende saudável!

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