Na passada semana, recebemos mais uma notícia daquelas que, depois de lermos o título, vamos confirmar, novamente, a fonte. Mas, infelizmente, não é (só) uma piada de mau gosto. O partido Chega propôs mesmo, na Assembleia Regional dos Açores, que o acesso à creche gratuita seja prioritário para crianças provenientes de agregados familiares cujos progenitores ou encarregados de educação estejam empregados. Ou seja, de uma forma muito direta, atira para o fim da lista os filhos de pais desempregados.

Sim, isto é discriminação.

Que o Chega, um partido de extrema-direita, proponha isto, (infelizmente) não espanta ninguém. Mas que o PSD e o CDS votem a favor… É de bradar aos céus. Até a Iniciativa Liberal, que tanto fala na importância do elevador social, decidiu abster-se, concordando, desta forma, com esta medida que, sem sombra de dúvida, coloca em causa a igualdade de oportunidades.

Sim, isto é desumano.

Mas as razões expostas por quem defende esta medida são ainda mais incompreensíveis. Ousam dizer que, mesmo em escolaridades mais avançadas, os filhos de pessoas desempregadas deveriam ser colocados em turmas com crianças com mais dificuldades. Alguém pode ajudar-me a perceber este argumento?! Eu, com toda a certeza, não tive a “sorte” de andar na escola idealizada pelo Chega e estou com sérias dificuldades em acompanhar o raciocínio. Daqui a pouco e inspirados pelo passado, estão a propor a identificação das pessoas desempregadas e respetivas famílias com um símbolo especial devidamente cosido na roupa…

Sim, isto é vergonhoso.

Mas há mais: se dificultamos a entrada na creche a crianças com pais desempregados (à partida, com mais dificuldades socioeconómicas), como é que esses mesmos pais vão conseguir procurar (e garantir) emprego? Vão com os filhos aos processos de recrutamento? Apresentam-se com eles nas entrevistas de trabalho? Ou o Chega vai revolucionar tanto isto que vai passar a ser garantido serviço gratuito de babysitting para estes pais? Vá lá… A Educação é uma plataforma de equidade, não pode ser um trampolim de privilégios, em que só alguns têm o luxo de “dar o salto”. E é quando uma família está a passar por uma situação de fragilidade, como é a do desemprego, que essa plataforma mais diferença pode (e deve) fazer. No entanto, parece que se optou pela direção oposta e a estratégia é, afinal, cavar ainda mais o fosso das desigualdades.

Sim, isto é uma injustiça.

Esta proposta representa tudo aquilo que não queremos para o nosso país. Sim, porque eu acredito que continuamos a querer um país justo, onde todos tenham igual acesso às ferramentas que permitem construir uma vida melhor. Um país onde uma condição de dificuldade e que se deseja temporária não se torne sinónimo de discriminação e, consequentemente, de dificuldades acrescidas e com duração “indeterminada”. Um país onde o Estado dê a mão para apoiar o cidadão e não apenas para o atirar para o final da lista.

Não, isto, afinal, não é mesmo uma brincadeira de crianças.

PUB