Rui Teixeira, dirigente do PCP Açores

Na semana passada, abordei o ruído mediático, dos lados da direita, sobre a elevada carga fiscal de quem trabalha. Sobretudo dos lados do PSD, mas não só, este discurso ganhou força, recentemente, à boleia do aumento brutal do custo de vida. Como já foi cientificamente demonstrado, a inflação resultou, sobretudo, da ganância das grandes empresas. Sobre esses lucros extraordinários, PSD e extrema direita ficam em silêncio. Também se calam nas suas responsabilidades sobre a carga fiscal do trabalho e os baixos salários. Daí que considere que o restante discurso sobre estes assuntos só pode ser ruído, pensando em futuras eleições.

De facto, a carga fiscal sobre trabalhadores, pensionistas e pequenas empresas é muito mais elevada do que aquela que cai sobre as grandes empresas. São bem conhecidos os perdões fiscais milionários e os lucros declarados no estrangeiro para fugir aos impostos, facilitados tanto pelos governos do PS, como pelos do PSD/CDS. Por isso, será bom termos presente esta espécie de amnésia estratégica da direita. Hoje, estará, na Assembleia da República, uma proposta do PCP para reduzir os impostos a quem trabalha. Será interessante ver como se posicionam o PSD e a restante direita, embora o passado dê segurança à previsão de que se juntarão ao PS.

Curiosamente, nos últimos tempos, assistiu-se à tentativa de limpar as más memórias que ficaram do governo do PSD/CDS, de Passos Coelho e Paulo Portas. E, vai daí, alguns deputados regionais do PSD apostaram em comparar o IRS de agora com o da altura. Então, vejamos: em 2015, último ano do governo do PSD/CDS, as receitas do IRS tinham aumentado 35% em relação a 2010. Já em 2011, PSD e CDS tinham dado a mão a José Sócrates, aumentando o IRS em 9%.

Entre 2016 e 2019, enquanto o PS foi obrigado a negociar com o PCP, o IRS reduziu-se, inicialmente, em 4%, e aumentou, posteriormente, 3%. No mesmo período, as receitas da Segurança Social aumentaram 22%, ou seja, 7 vezes mais. Isso significa que o aumento das receitas de IRS se deve, sobretudo, ao aumento dos trabalhadores empregados, já que o salário médio não evoluiu na mesma proporção. Ou seja, o IRS ganhou peso, sobretudo, pela redução do desemprego, que tinha sido a marca mais dura do governo do PSD/CDS.

Mas será importante saber porque não aumentaram os salários. É que o PS travou todas as propostas do PCP nesse sentido. E, como o PS não tinha maioria absoluta, teve de ter apoio noutro lado… E de onde veio esse apoio? Quem olhar para as votações na Assembleia da República perceberá facilmente: do PSD e restante direita, que, ao mesmo tempo, promovendo um ruído mediático permanente, procuraram esconder o seu posicionamento ao lado do PS!

Mas, talvez para disfarçar estas ficções, resolveu o PSD regional queixar-se do espaço que tem na comunicação social e no comentário televisivo. E aqui é que a opinião se torna surreal, por ignorar, por completo, a realidade. Faço a seguinte sugestão: escolha-se qualquer espaço na televisão em que um comentador esteja sozinho, sem contraditório. Para ajudar, refiro dois nomes: Paulo Portas e Marques Mendes, do CDS e do PSD, com grandes responsabilidades em governos de direita. Na generalidade dos espaços de comentário partilhado, vai dominando a direita, muitas vezes mal disfarçada de opinião independente, mas que vai sempre caindo para o mesmo lado, das velhas políticas liberais, da justificação dos salários baixos, de que a economia não é competitiva por culpa dos trabalhadores. E assim, por força do peso da direita no comentário televisivo, a realidade vai sendo crescentemente deturpada pela opinião, cada vez mais divorciada daquilo que sentem, no dia a dia, as famílias e os trabalhadores…

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