“A verdadeira glória não está em colocar os outros debaixo dos nossos pés, mas em curvar-se diante do outro ao serviço da sua necessidade e da sua alegria”, diz o Bispo de Angra

Foto: Igreja Açores/HS

D. Armando Esteves Domingues presidiu à Missa da Ceia do Senhor na Sé, mas antes lavou os pés a 12 utentes das casas de saúde de São Rafael e do Espírito Santo, num gesto inédito na diocese, valorizando a caridade e o serviço aos mais frágeis

Foto: Igreja Açores/HS

O bispo de Angra, que preside pela primeira vez na diocese insular às grandes celebrações pascais, afirmou que o serviço e a caridade, expressos nos dois gestos do lava-pés e da partilha do pão na Última Ceia, constituem o verdadeiro testamento de Jesus.

“A verdadeira glória não está em colocar os outros debaixo dos nossos pés, mas em curvar-se diante do outro ao serviço da sua necessidade e da sua alegria. A verdadeira glória não está em tirar a vida do outro, mas em compreender-se como vida para o outro, seja ele quem for” afirmou D. Armando Esteves Domingues na homilia da Missa da Ceia do Senhor a que presidiu esta noite, na Sé de Angra.

Na Missa Vespertina, que assinala este tempo pascal com um caráter festivo, evocando o mandamento do amor e do serviço, simbolizado no gesto do lava-pés, “é bom recordar que a única veste litúrgica que Jesus usa em todo o Evangelho é o seu humilde avental”, afirmou o prelado.

“Que missa, que Eucaristia, aquela que celebramos quando vestimos os aventais e lavamos os pés uns dos outros, e nos entregamos aos outros. Não há alegria mais bela do que fazer algo bom pelos outros” disse o prelado, refletindo igualmente sobre a caridade e o gesto da partilha do pão, momento alusivo à instituição da Eucaristia, na última Ceia.

Foto: Igreja Açores/HS

“Jesus prepara o seu testamento de vida com as últimas palavras e alguns gestos” sublinhou D. Armando Esteves.

“Estes gestos vão torná-lo verdadeiramente presente entre os seus, ali e no futuro, sempre que se reúnam em seu nome. São gestos que nos contam o que Ele é e será para o mundo, que falam do seu e nosso Deus e nosso Pai. Dois gestos que resumem a Sua Vida e todo o evangelho” clarificou o prelado deixando votos de que os cristãos possam seguir o seu exemplo.

“Precisamos de voltar a ser estas famílias reunidas à volta da mesa com Jesus, já em cada casa, e que, porque abertas aos irmãos, se reúnem na casa da Igreja onde circula a força do Mandamento Novo de Jesus: amai-vos uns aos outros como eu vos amei”, enfatizou.

“A Eucaristia continuará a ser atualização deste gesto criador e memória da Sua paixão, Morte e Ressurreição” disse o prelado.

“Neste gesto de partir o pão, os seus, nós e o mundo, vamos reconhecê-Lo pelo que ele é: um Tu que nunca destruiu ninguém, que nunca derramou o sangue de ninguém, que nunca devorou ninguém, mas que, pelo contrário, em conformidade com a vontade do Pai e livremente se entregou àqueles que injustamente o «partiam», o faziam sangrar e o brutalizavam”, lembrou D. Armando Esteves Domingues.

O bispo de Angra lamentou, por outro lado, que a catequese hoje esteja desvalorizada e que as famílias sejam incapazes de ensinar a relevância da comunhão na vida de um cristão.

“Chega a ser deprimente ver como muitas famílias, devido ao ensino incompleto que fomos fazendo nas paróquias e que já não serve hoje, se esforçam apenas por `levar os filhos à primeira comunhão´, como a um rito isolado ou um prémio que se recebe por ter `ido à catequese´, em vez de se questionarem, antes de tudo, sobre a qualidade da vida cristã vivida entre todos na família e centrada em Cristo” afirmou.

A este propósito o prelado questionou a fé que hoje parece que se alimenta apenas do pão material mas esquece o verdadeiro pão da vida que é Deus.

“Ouve-se por vezes irrefletidamente aos mais novos: “fui tomar a hóstia…”. Até arrepia, só de ouvir! A hóstia é Cristo! Será que a nossa fé chega até Ele, ou fica só no pão?”, interpelou, deixando um apelo final: “Alimentemo-nos do Amor deste dia para nos tornarmos amor, deixemo-nos lavar os pés para nos tornarmos mensageiros das boas novas a todos os irmãos”.

Capela da Casa de Saúde de São Rafael

Foto: Igreja Açores/HS

Antes o bispo de Angra esteve na Casa de Saúde de São Rafael, e presidiu à celebração da Missa da Ceia do Senhor com os utentes das casas de saúde de São Rafael e do Espirito Santo.

O prelado lavou os pés a 12 utentes- homens e mulheres- das duas instituições de saúde mental da ilha Terceira e na homilia, em jeito de diálogo muito informal, foi explicitando o que está em causa nesta celebração, sublinhando a importância do serviço, manifestado na humildade do gesto do lava-pés; da caridade expressa na partilha do pão e do amor que se manifesta no cuidado.

“Ajudar, acompanhar, cuidar…precisamos de irmãos que nos sirvam e nos ajudem. É tão bonito este amor que Jesus derramou por nós e que quer que nós derramemos pelos irmãos. O melhor que recebemos Dele é este amor”, exclamou o prelado, que no próximo domingo também terá um gesto semelhante e além da missa de Páscoa na catedral, celebrará na cadeia com os reclusos do Estabelecimento Prisional de Angra.

A Missa vespertina da Ceia do Senhor assinala o início do Tríduo com um caráter festivo, evocando a instituição da Eucaristia e do sacerdócio e o “mandamento do amor”, simbolizado no gesto do lava-pés.

A evocação da Última Ceia de Jesus com os seus discípulos, no Cenáculo, segue os relatos dos evangelistas Marcos, Lucas e Mateus, bem como do apóstolo São Paulo.

Após a Missa, só volta a existir celebração da Eucaristia, na Igreja Católica, na Vigília Pascal; antes da celebração, o sacrário deve estar vazio e, no final da mesma, após a oração da comunhão, forma-se um cortejo, passando por toda a Igreja, que acompanha as hóstias consagradas até ao lugar onde ficam até à noite de sábado, numa capela reservada para o Santíssimo Sacramento.

Simbolicamente, o altar da celebração é desnudado, como sinal do despojamento e sofrimento do Cristo.

Esta sexta-feira celebrar-se-á a Paixão do Senhor, uma celebração focada na Cruz.

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