Mais um ano de incertezas e muitas tristezas para quem habita no nosso território continental. As labaredas que pareciam adormecidas em junho e julho, elevaram-se com violência e certeza destrutiva, a partir do começo de agosto. Junta-se a vaga de calor à vontade de consumir tudo o que resta de verde no coração do nosso país. E as populações sofrem, desesperadas por sobreviver e manter uma parte do parco património que levaram uma vida inteira a construir, apenas para o ver desaparecer debaixo de uma nuvem de cinzas.

Para o ano, há zonas em Portugal onde não haverá fogo para combater. Já tudo ardeu. Assim tem sido ao longo de anos e anos de ingerências, assobios para o lado e, pior do que tudo o resto, apoios financeiros e administrativos junto de empresas de reflorestação, madeireiras e outras indústrias que beneficiam de forma direta desta realidade, que para muito boa gente é apocalíptica.

Os incêndios florestais não são uma novidade de 2025, nem sequer do século XXI. Ao longo de centenas de anos, Portugal tem enfrentado complicações com vagas de calor, profundamente agravadas pelas atuais alterações climáticas, que empurram o país para o ponto de não retorno. Paralelamente, há que reconhecer a presença de incendiários e agentes provocadores, a mando de interesses económicos, ou apenas incentivados por patologias psicológicas que só podem ser devidamente reconhecidas por profissionais, e não por comentadores de partidos populistas, por muito que alguns possam até perceber de psicopatias na primeira pessoa.

A realidade dos fogos de Verão tem vindo a crescer em intensidade, pese embora flutue anualmente no número de acidentes verdadeiramente graves. Não obstante, há muito tempo que não se passa um ano sem problemas com chamas e reportagens dedicadas a desalojados, com choros e gritos.

Do lado da oposição, habituamo-nos a ver discursos inflamados, contra as políticas de gestão e administração interna, reclamando para si o direito de tomar o poder e resolver a questão. Quando a situação se inverte, verificamos que raramente se tomam medidas, e que quando tal é aplicado, a situação tende a piorar. Assim, há um jogo de cadeiras, outrora entre dois partidos, agora com a presença de uma terceira força, ainda mais tóxica, onde os incêndios são mais importantes quando se pode falar mal do Governo, do que quando se pode fazer alguma coisa para os prevenir e combater.

Regressamos a 2025 e ao caos instalado em Portugal, uma vez mais, pelas chamas que assolam várias zonas do território continental. Nas televisões, multiplicam-se os gritos de revolta de autarcas, bombeiros e gentes em geral, que arregaçam as mangas para tentar salvar vidas inteiras de trabalho e poupança, perdidas numa faísca trazida pelo vento de agosto. Nas sedes dos partidos da oposição, as conversas habituais, reclamando o direito de salvar a pátria entumecida pelo calor. E no governo, uma incompetência anormal, o que é dizer muito comparando-se com anos anteriores, diga-se de passagem.

Montenegro seguiu o exemplo do seu colega de partido, e amigo, madeirense. Foi de férias, e só as interrompeu depois da primeira morte, como quem diz que só vale a pena levantar da toalha quando a coisa aperta. Ainda houve tempo para beijos, abraços e danças de Verão, no Pontal, com o partido. Afinal de contas, para que serve um primeiro-ministro se não der o exemplo e for à banhoca com a família? E não deve o partido ficar à frente do cidadão comum? Para cuidar do país está lá a ministra, não é? A senhora ministra, que veio então falar em público, para nos dar uma mão cheia de nada. Assim que a primeira pergunta surgiu, levantou-se, agarrada ao colar de pérolas saído diretamente da corte de Luís XIV, e fugiu porta fora, anunciando que se iam embora. Ficou por dizer que iam, antes que a coisa azedasse e as guilhotinas viessem para cima da mesa, claro está.

O primeiro-ministro também quis dar dois dedos de conversa aos coitadinhos, e centrou o discurso em acusações aos criminosos, que diz que vai combater de punhos cerrados, mesmo que não existam dados concretos, nem provas que estes incêndios, e a gravidade dos mesmos, sejam consequências de fogo posto. Haverá quem o faça, imaginamos. Mas que seja o problema principal, tenho sérias dúvidas. Só que é mais fácil criar inimigos imaginários do que assumir que não se sabe o que se está a fazer. O seu amigo Ventura que o diga, caro Luís.

Na verdade, a incompetência destes filhos da coligação PAF não é coisa nova, nem exclusiva do tempo dos fogos. Todavia, estes cenários que se multiplicam, e provavelmente continuarão a multiplicar-se até ao final de setembro, são catástrofes que poderiam ter sido acauteladas. O que não falta são especialistas que já escreveram sobre o assunto, há décadas, apelando à educação ambiental, à criação de planos de prevenção concretos (para lá de meros chavões) e à melhoria das estratégias de combate, partindo da administração interna, fornecendo ferramentas à gestão autárquica e capacitando os verdadeiros profissionais.

Numa casa de governantes onde até chegou a estar presente o partido de Gonçalo Ribeiro Telles – antes de ser saneado pela inconveniência trágico-cómica do seu líder nacional -, verifica-se que a mensagem de meritocracia só se aplica para enganar empreendedores e para a Europa ver. A experiência dos especialistas fica muito aquém das pérolas da ministra, do discurso populista sem substância do primeiro-ministro regressado da toalha, ou da solidariedade de cordel do presidente da República em final de carreira. Portugal continua a arder, e quem quer saber não quer que isso acabe. Afinal de contas, os fogos dão mais dinheiro que chatices, aos grandes empresários. E dão mais votos que problemas, aos políticos.

Montenegro deu a mão, o país e o nosso futuro a um partido que se diz ser financiado por um dos cabeças do cartel que lucra com os fogos. Mas, para Montenegro é melhor assim, possa ser que o seu colega lhe dê um espaço no gabinete do staff.

Um abraço a toda as pessoas que lutam. Solidariedade para com todas as vítimas deste cenário dantesco. Às e aos bombeiros que são quem está na linha da frente, arriscando a vida. Mereciam mais do que esta gentinha.

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