O Padre Weber Machado nasceu a 6 de Outubro de 1931 na Freguesia de Água Retorta, uma das fronteiras do Concelho da Povoação, do lado do Concelho do Nordeste, que durante muitos anos foi uma das freguesias mais remotas da ilha de São Miguel, mas com uma população muito resiliente, com uma economia e sociedade profundamente rural, em que dominava a produção de cereal, vinho, madeiras, gado, queijo, e com uma acessibilidade ao mar difícil, mas que existia, e até era fonte de subsistência e comunicação com o resto da ilha, tendo como o seu expoente máximo a Fajã do Calhau.

Como me disse uma vez o saudoso Senhor António Pereira, um grande amante da Fajã do Calhau, e então, Presidente da Junta de Freguesia de Água Retorta: “para este local e esta Freguesia ter qualquer coisa é preciso muita luta, muito conhecimento, muita insistência e muito trabalho, foi assim com a água para Freguesia, e até com a luz”. O certo é que esta Freguesia era um modelo de trabalho e até tinha e tem uma Banda de Música, uma Freguesia presentemente fustigada pela crise demográfica, tendo apenas 429 residentes e que, de acordo com o Censo de 2021, perdeu cerca de 50% de população nos últimos 50 anos.

De realçar que os filhos da Terra quando vinham trabalhar para Ponta Delgada, destacavam-se pela sua tenacidade, iniciativa e criatividade, refiro dois nomes que atestam bem este espírito, o Dionisio Raposo Leite e o Pimentel da União de Ferragens. Foi exatamente neste local remoto (onde fica o local conhecido como o CU de Judas), de grandes dificuldades, mas de forte resiliência e gerador de pessoas excecionais, que nasceu o Padre Weber Machado.

O Padre Weber Machado frequentou o Seminário Episcopal de Angra e foi ordenado no dia 29 de junho de 1958 em São João de Latrão em Roma. Estudou na Pontifícia Universidade Gregoriana, com sede em Roma, tendo-se licenciado em Teologia Sistemática, a que acrescentou uma licenciatura em Matemática na Universidade de Lisboa em 1964 (não é muito comum um Padre licenciar-se em matemática), tendo posteriormente exercido funções de Docente no Seminário Episcopal de Angra e no Seminário Colégio Santo Cristo em Ponta Delgada. O Padre Weber Machado era uma pessoa culta, com uma visão conhecedora do mundo, que contactou com muita gente, vivendo experiências relacionadas com a Doutrina Social da Igreja, que marcaram a sua opção de vida e forma como serviu a Igreja e a Sociedade.

Declarou-se um entusiasta das Semanas de Estudo dos Açores (1961), em que participaram ativamente José Enes e Cunha de Oliveira, duas pessoas então ligadas também à Igreja de Angra, que viajaram até Roma e outros países europeus em 1945. Como escreveu Cunha de Oliveira, esta viagem teria sido muito importante para o futuro pensamento e ação deles e, de algum modo, transportaram este conhecimento para as semanas de estudo, com tudo o que significaram para o diagnóstico dos Açores daquele tempo (1961) e a necessidade de implementação de um novo modelo de desenvolvimento Económico e Social nos Açores. Uma iniciativa que envolveu e entusiasmou muita gente, mas que gerou muita desconfiança por parte da ordem estabelecida, o que comprometeu os objetivos que pretendiam os seus dinamizadores.

O contacto do Padre Weber com a Doutrina Social da Igreja e com as encíclicas dos Papas Pio XI, João XXIII e Paulo VI, que colocaram temas para discussão e até doutrinação, como a relação entre o capital e o trabalho, os direitos sociais dos trabalhadores, a caridade, a solidariedade, a subsidiariedade, entre outros, levou-o a optar decididamente pelo lado dos mais fracos, dos excluídos, em síntese, dos mais pobres.

Foi exatamente esta opção que levou o Padre Weber Machado em 1969 a assinar a Declaração de Ponta Delgada, um Manifesto redigido pelo Ernesto Melo Antunes que denunciava a falta de liberdade existente em Portugal, a repressão, a Guerra Colonial e a ausência de Desenvolvimento, assinatura esta que viria a ter consequências na perseguição a que foi sujeito. É conhecida a sua afirmação: “Se comunismo era defender a Doutrina Social da Igreja então eu era um enormíssimo comunista”.

Já depois do 25 de abril de 1974, o Padre Weber Machado, usando os instrumentos que a liberdade e a Democracia permitiram, desenvolveu um forte trabalho à frente da Cáritas, mobilizou vários grupos de instituições e da sociedade civil para apoiarem nas ruas de Ponta Delgada os pobres e os sem-abrigo, com alimentos e refeições, continuou a denunciar a pobreza com todos os meios que tinha ao seu dispor, foi uma voz incómoda para alguns setores da própria igreja e um crítico do investimento de fachada e do desperdício.

Padre Weber e Álvaro Esteves

Quando o Conselho Económico e Social dos Açores colocou na sua Agenda, através da sua Comissão dos Assuntos Sociais, presidida superiormente e com conhecimento pelo Prof. Doutor Fernando Diogo, o problema da pobreza nos Açores e eu próprio declarei que “a Pobreza nos Açores nos devia envergonhar e não estávamos condenados a ter tanta Pobreza”, o Padre Weber Machado pediu de imediato uma reunião comigo, a que se seguiram várias, para dar contributos. Era, pois, um membro da nossa comunidade muito atento ao trabalho desenvolvido pelo CESA, escrutínio que passou ainda a ser reforçado quando o Prof. Doutor Fernando Diogo e a Comissão dos Assuntos Sociais do CESA promoveram um encontro sobre os sem-abrigo, envolvendo múltiplas entidades regionais e estudiosos deste fenómeno ao nível regional e nacional, que atravessa a nossa sociedade e principalmente o Concelho de Ponta Delgada e neste, em particular, a Cidade de Ponta Delgada. Neste encontro, procedeu-se a um diagnóstico rigoroso e foram produzidas propostas concretas para mitigar a situação.

Recuando ainda mais no tempo, não foram raras as vezes que o Padre Weber Machado me procurou no meu local de trabalho para falarmos e foi com uma alegria enorme que o vi na assistência naquela noite de 30/07/2022 no Cine Teatro Vale Formoso, em que um grupo de amigos do Duo Top Furnas decidiu homenagear-me na minha terra de nascimento. Naturalmente, também estava com ele o seu amigo Álvaro Esteves, que sempre o acompanhou, principalmente na fase em que estava mais frágil.

Finalmente, é relevante que a Associação Seniores de São Miguel tome esta iniciativa de homenagear o Padre Weber Machado, quem tantas vezes vi sentado e a participar nas sessões desta Associação.

Como me dizia o Jaime Gama um destes dias: “o Padre Weber, em síntese, era um Bom Amigo”, ou o Fernando Diogo: “o Padre Weber – uma enorme força que agora se vai”, e o Onésimo Almeida: “e vai fazer muita falta a sua chamada de atenção para os problemas sociais”.

 

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