Nesta quinta-feira abrem-se portas à redenção. Somos convocados para a expressão máxima do amor: perdoar os inimigos. Não é fácil compreender o desafio de um amor sem limites, que estabelece uma nova aliança, que rompe com a velha lei e a justiça implacável do olho por olho, dente por dente. Passados dois mil anos, ainda não absorvemos em plenitude o novo caminho da vida. A tentação é grande. Preferimos trinta moedas, fáceis, trocadas pelo beijo de uma traição, como fáceis são todas as hipocrisias. Desembainhamos a espada, com voluntarismo. Cortamos a fio, quantas vezes sem olhar por onde e a quem. Cada problema, cada incómodo, entregamo-lo a Herodes. Lavamos as mãos. E logo julgamos sossegar a consciência. Negamos uma, duas, três vezes. Por indiferença. Por comodismo. Por egoísmo. Erguemos o cetro, símbolo efémero dos poderes que perseguimos com obstinação. Cravejamos a coroa, implacavelmente. Repartimos as vestes. E sem rebuço deitamos sortes sobre a túnica. Desviamo-nos, incessantemente do caminho do Calvário. Porque nos incomoda o pó da estrada, e mais ainda a subida íngreme da dor. Tememos a sombra da cruz, que nos encobre de remorsos. Mas esta quinta-feira, no gesto humilde de lavar os pés, eleva-se a grandeza de um novo mandamento. Do que se deixa beijar por Judas. Que perdoa a mulher adultera. Janta com Zaqueu. E se perfuma nos cabelos de Madalena. Que faz andar os coxos e ver os cegos.
Esta é a quinta-feira maior. Com ela aprendemos a partilhar o nosso pão de cada dia, a dar a outra face, a levantar o samaritano.
Santa Páscoa.