O Governo açoriano reafirmou hoje a “profunda preocupação” com a proposta do PS para alterar a Rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores (RAMPA) para permitir a pesca de atum de salto e vara em áreas de proteção total.
Em comunicado, a Secretaria Regional do Mar e das Pescas sustenta que esta medida representa “um retrocesso significativo nos compromissos assumidos pela Região no âmbito da conservação marinha” e apela a uma decisão “responsável”, que preserve o futuro do mar dos Açores e a sua posição de “vanguarda na conservação dos oceanos”.
“A proposta baseia-se em pressupostos que colidem com a evidência científica existente”, reforça o Governo Regional (PSD/CDS-PP/PPM).
O executivo açoriano lembra que a RAMPA foi concebida com base nos critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza, com o intuito de “cumprir os objetivos definidos no Quadro Mundial de Biodiversidade, na Estratégia Europeia para a Biodiversidade 2030 e na Estratégia Nacional para o Mar 2030”.
Entre essas metas, destaca-se “a proteção legal de 30% das águas sob jurisdição nacional, incluindo pelo menos 10% com proteção total”.
Por isso, alerta o Governo Regional, a “desclassificação agora proposta compromete diretamente o alinhamento da RAMPA com padrões internacionais, tornando-a incompatível com os compromissos ambientais nacionais e regionais”.
Para o Governo açoriano, a alteração proposta pode ainda “enfraquecer a posição institucional” da Região na gestão partilhada do mar, com “repercussões legais e políticas a nível nacional e internacional”.
A Secretaria Regional do Mar reitera que a proposta do PS “pode levantar questões de constitucionalidade, ao colidir com o princípio da proteção ambiental consagrado na Constituição da República Portuguesa”, assinalando que do ponto de vista socioeconómico, os impactos da RAMPA na frota de salto e vara “foram devidamente analisados” através do sistema de monitorização MONICAP, do Instituto OKEANOS.
As conclusões apontam para um impacto estimado de apenas 7% na atividade da frota do salto e vara, localizado sobretudo em quatro bancos de pesca (Formigas, Princesa Alice, D. João de Castro e Condor), totalizando cerca de 1.522 km² – uma área marginal face aos mais de 160.000 km² atualmente classificados como de proteção total, agora ameaçados.
Esclarece ainda que a RAMPA conta com um financiamento de 10 milhões de euros no âmbito do programa Blue Azores, destinado à sua implementação, monitorização e ao apoio à transição sustentável do setor das pescas, um apoio que poderá estar “em risco” com a desclassificação das áreas protegidas.
A Secretaria Regional refere ainda que o Fundo Ambiental “já prevê compensações financeiras aos armadores afetados, num montante inicial de 1,5 milhões de euros, abrangendo os primeiros três meses da implementação da RAMPA”.
A totalidade do mecanismo de compensação e a sua duração terão ainda de ser acertados, tal como as fórmulas de cálculo e os critérios de elegibilidade, que estão a ser definidos em colaboração com a Universidade dos Açores.
A Secretaria Regional do Mar e das Pescas realça que os Açores “têm sido amplamente reconhecidos como um exemplo de liderança na proteção marinha a nível global” e a RAMPA tem sido “estudada internacionalmente como modelo de referência”, alegando que a sua desclassificação “comprometeria seriamente a reputação da Região, com potenciais perdas em termos de credibilidade, apoio financeiro e impacto económico”.
O PS açoriano quer alterar a legislação que criou a Rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores (RAMPA) para facilitar a pesca do atum, mas a Fundação Oceano Azul alerta que isso terá custos reputacionais para Portugal.
O grupo parlamentar do PS açoriano apresentou no plenário de março a proposta de alteração e pediu que esta fosse discutida com caráter de urgência, mas o pedido foi rejeitado pelo PSD, Chega, CDS-PP, PPM e PAN.
Na apresentação da iniciativa, a deputada Joana Pombo Tavares justificou o pedido de autorização da pesca com a arte de salto e vara para atum nas áreas de proteção total por se tratar de “um método de pesca artesanal” em que “o pescador pode selecionar o peixe que captura, evitando capturar peixes mais jovens ou espécies não comerciais”.
O presidente do PS/Açores, Francisco César, também defendeu recentemente a captura de atum com arte de salto e vara nas zonas marinhas protegidas da região, alegando que não há fundamento científico para a proibição.