Um estudo elaborado pela Global Fishing Watch, uma organização internacional sem fins lucrativos, revela que, nos últimos cinco anos, apenas 1% dos atuneiros dos Açores capturou atum em zonas que vão passar a ser classificadas como áreas marinhas protegidas.
“O estudo elaborado pelos nossos parceiros, com base no histórico do AIS [sistema de rastreamento a bordo] de 26 atuneiros dos Açores, mostra que apenas uma ínfima parte dessas embarcações capturou atum nestes locais”, explicou Bernardo Brito e Abreu, da Fundação Blue Azores, que publicou o estudo no seu site, na internet (https://pt.blueazores.org).
Para a Blue Azores, parceira do Governo dos Açores na criação de novas áreas marinhas protegidas, aprovadas pelo parlamento regional em novembro de 2024, “não faz sentido” excecionar agora a pesca do atum, com a arte de salto e vara, das novas áreas de proteção, como defende a bancada do PS na Assembleia Legislativa dos Açores.
“Seria um grande retrocesso e seria um descrédito, a nível internacional, da região, que trabalhou imenso para alcançar este estatuto, e de Portugal. Estamos a pôr aqui muitas questões em causa”, advertiu Bernardo Brito e Abreu, lembrando que as metas internacionais estabeleciam que “todos os países teriam de ter 30% do seu mar protegido”.
As declarações do representante da Blue Azores surgem na sequência de uma proposta apresentada no parlamento açoriano, pela bancada do Partido Socialista, que pretende introduzir uma alteração à legislação das áreas marinhas protegidas, para permitir a pesca com salto e vara, uma arte de pesca alegadamente “seletiva” e “amiga” do ambiente.
“Não há nenhum estudo científico que diga que esta arte de pesca é predatória, é danosa para aquele meio ambiente, ou para aquela reserva”, insistiu Francisco César, líder do PS/Açores, em declarações aos jornalistas, no arranque das jornadas parlamentar que o partido está a realizar na ilha de Santa Maria.
Para o dirigente socialista, a proposta apresentada no parlamento surge com a clara convicção de que “é possível esta coexistência” entre a pesca do atum com salto e vara e a preservação das novas áreas marinhas protegidas no arquipélago.
A Secretaria Regional do Mar e das Pescas do governo açoriano já veio, entretanto, manifestar o seu “profundo desagrado e preocupação” em relação à proposta apresentada pelo PS, considerando tratar-se de um “retrocesso” em matéria de proteção marinha.
“Esta iniciativa representa um retrocesso significativo na proteção dos recursos marinhos da Região e coloca em risco os compromissos assumidos pela Região e pelo país no âmbito da conservação ambiental e da sustentabilidade dos ecossistemas marinhos, a nível internacional”, advertiu, em comunicado, o executivo regional de coligação (PSD, CDS-PP e PPM).
Para o executivo liderado pelo social-democrata José Manuel Bolieiro, as áreas marinhas de proteção total “são incompatíveis” com qualquer tipo de extração, uma vez que foram criadas com o objetivo de proteger “ecossistemas sensíveis” e garantir a “regeneração natural das espécies marinhas”.
O Governo lembra também que a Rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores (RAMPA), prevê áreas de proteção alta, onde é permitida atividade da pesca com salto e vara, e zonas de proteção total, onde é proibida qualquer tipo de atividade extrativa, incluindo a pesca de atum com salto e vara.
“Os Açores têm sido reconhecidos internacionalmente como um exemplo na conservação e gestão sustentável dos recursos marinhos, alinhando-se com metas globais estabelecidas por iniciativas como a Convenção sobre Diversidade Biológica e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas”, lembra o executivo.
A criação de áreas marinhas protegidas em 30% do mar dos Açores foi aprovada em outubro de 2024 na Assembleia Legislativa Regional, com os votos a favor do PSD, PS, CDS-PP, PPM e BE, a abstenção do PAN e os votos contra do Chega e da IL.