Alexandra Manes

Quando nos sentamos numa livraria, longe estamos de imaginar que vamos assistir a uma aula de filosofia. Quanto muito, podemos pensar nas letras filosóficas que se escondem por detrás das páginas de cada livro que se encontra estoicamente guardado nas prateleiras daquele espaço. E, no entanto, ela move-se. E a Lar Doce Livro trouxe-nos, no passado sábado, dia 25 de janeiro, uma experiência única, nesse sentido.

Paulo Alexandre Monteiro é um dos mais relevantes arqueólogos subaquáticos do mundo, na atualidade. Energético lutador contra a caça ao tesouro e reconhecido investigador de relevo na área científica do mundo submerso, é também um comunicador de excelência e um paladino da arqueologia e dos patrimónios a ela associados.

Começou a sua carreira de arqueólogo na ilha Terceira, na década de 90 do século passado, e desde então já correu uma boa parte do mundo, em busca de heranças comuns que Portugal foi plantando por onde passou nas suas viagens.

Ao abrigo do ciclo de conferências «Conversas com Arqueologia», a Lar Doce Livro promoveu a vinda de Alexandre Monteiro à ilha Terceira, para conversar sobre o vasto trabalho que ajudou a desenvolver, na baía de Angra do Heroísmo, e não só, durante a sua estadia no arquipélago, enquanto arqueólogo subaquático, em articulação com o Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática.

O resultado foi um final detarde muito bem passado, onde se discutiram caminhos e vieses, e onde se procurouencontrar um ponto de continuidade, naquilo que a atual Direção Regional da Culturapromove através do seu gabinete de arqueologia.

Em abono da verdade, a atual realidade é mais complexa do que poderia parecer à primeira vista. É do conhecimento geral que os arqueólogos da direção regional abandonaram o Centro onde estavam instalados, por motivos nunca explicados, e devidamente promovidos por chefias que não se justificaram. Pelo menos é a informação que nos vai chegando, a partir dos caóticos corredores do poder, no Palacete Silveira e Paulo. Não desejo elaborar. Mas é de conhecimento público, ou deveria ser, que esses mesmos arqueólogos foram responsáveis pela única Marca do Património Europeu alguma vez atribuída ao património arqueológico subaquático, em todo o mundo. E sabemos que esse caminho foi feito, muitas vezes à revelia de chefias, e de gabinetes bafientos de onde emanaram vozes de dissonância.

Essas vozes cruzaram-se na Lar Doce Livro, livraria e espaço de restauração de excelência, que já tive oportunidade de aqui enaltecer noutras circunstâncias. Guiadas pela mão de Alexandre Monteiro, mergulhamos nesses trabalhos, e partilhamos conhecimento e boa disposição. Sabemos que havia assuntos mais polémicos, referentes a tudo logia, que foram aflorados de forma genérica. Mas é do mundo subaquático e da sua importância, que vale a pena falar. Porque por mais que as nossas classes governantes tentem abafar essas valências, a terra continua a girar, e a arqueologia subaquática continua a dar resultados.

Assim, e contrariando a atual tendência para falar de malas, aeroportos, amamentações e outros assuntos infelizes, este é um texto que serve apenas o propósito de agradecer ao Alexandre, ao Luís Neto, à Marta e ao Joel, por nos terem potenciado um oásis no meio de tanta parvoeira que pulula na nossa atualidade.

Os Açores são um dos pontos do mundo com maior potencial referente à sua arqueologia submersa, enquanto ativo turístico e cultural. Alexandre Monteiro recordou-nos essa realidade e deixou um apelo a quem decide. É preciso uma visão do alto da política regional. Mais investimento. Maior número de recursos humanos. Incremento da representatividade dentro da respetiva orgânica. E reconhecimento daquele setor dentro da cultura pública. Foi o único setor que deu resultados verdadeiros, em anos recentes.

Valorizem os nossos gabinetes de arqueologia, sob pena de perderem as pessoas que querem bem aos Açores, se assim não o fizerem. Subscrevo.

 

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