Alexandra Manes

Seria muito fácil debruçar-me agora, sobre estas linhas,apenas todas as raivas que o mundo nos deu nos últimos dias. 2024 continua a ser o ano de todas as desgraças, com o controlo total das forças da mais conservadora direita política em quase todo o mundo. Donald Trump foi apenas o culminar de uma bola de neve lançada há muitos anos. Agora, será Rei-Sol, controlando todos os órgãos de poder dos Estados Unidos, e eliminando os famosos checks and balances, porque até os tribunais já se ajoelharam à sua frente. De dentro do sistema, não haverá ninguém capaz de parar o novo culto republicano. Mas há sempre a resiliência da sociedade civil, não nos esqueçamos.

Seria fácil ir por aí, e soltar a voz da mágoa e da angústia de uma pesada derrota para a democracia, mesmo que quem tenha falhado tenham sido as forças neoliberais do partido democrata, que em nada se assemelham ao mundo que eu defendo. Kamala Harris, e as forças em seu redor, perderam uma boa oportunidade para demonstrar que o futuro dos Estados Unidos se joga em dois polos, e que os acordos centristas acabam mal para os que assinam com boas intenções. Portugal, muito em breve, terá de aprender essa lição.

Tenho lido com muita atenção, cuidado e emoção, a maneira como se chora, pelo mundo fora. Tenho apreciado as pessoas que agora preparam novos movimentos reformistas, sedentas de luta, incapazes de baixar os braços. Ponderei detalhar cada comunicado que saiu nos últimos dias, ou até mesmo analisar os discursos da candidata derrotada, de Obama, Bernie Sanders ou tantas outras personalidades políticas americanas que não baixaram a cabeça, mas capitularam perante o grande inimigo.

A mensagem de hoje não será essa, porque não é esse o futuro em que quero crer. Quem me conhecer melhor, ou acompanha os escritos que por aqui vão passando, saberá que é mais comum falar de coisas tristes, catástrofes em curso, ou perspetivas sombrias de futuro. Mas saberá, igualmente, que eu acredito nas pessoas e na Humanidade. Que o caminho apocalíptico é apenas mais uma arma de arremesso para quem nos quer oprimir. Sei que não vou por aí.

Acordamos para um mundo que deu um longo passo em direção ao abismo. E é nesse mundo que eu viverei, incentivando crianças e adultos a nunca deixarem de idealizar e batalhar. Os Estados Unidos baixaram os braços, mas não desapareceram, ainda. Há tempo para fazer o luto, mas não nos deixemos cair na tentação de nos agarrarmos à tristeza. Quem vive nos Açores, sabe bem que no mais duro dos Invernos haverá sempre muitos dias de sol. Apelo ao combate. À leitura. E à bondade.

Que não se percam os valores que nos fizeram humanos. Que se fale e se aprenda a valorizar a sabedoria. Que se resista e nunca se deixe para trás a persistência. Que se combata, sempre com imaginação e rebeldia. Que se quebrem as algemas e se enfie no passado o conceito de tirania. Que se perspetive futuro, sorriso e utopia. E que se continue sempre a marchar e a fazer o que eles mais odeiam, que é a poesia.

Hoje, mais do que nunca, devemos aos anos que se seguem a obrigação de continuar em frente. Trump ganhou. Ventura saiu com reforçada posição extremista. E o que faremos nós, senão mostrar ao país e ao mundo que continuamos a acreditar? Não precisamos de bombas, balas ou facas. Precisamos é de uma estratégia que nos una, pelo amor fraterno, pela justiça social e pela liberdade de pensamento.

Podem decretar o fim do mundo, que nós continuaremos a lutar.

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