Daniela Silveira, Gestora de Projetos

O título deste artigo pode induzir o leitor em erro, mas não se deixe enganar: “O Novo PS” aqui mencionado não é o Partido Socialista, mas sim o Partido Social Democrata (PSD). Após 30 anos de domínio do PS, o PSD, que passou os mesmo 30 anos na oposição, finalmente ascendeu ao poder. No entanto, esse regresso ao governo trouxe consigo profundas alterações na identidade e nas práticas políticas do partido, levantando a questão: estará o PSD a tornar-se num “Novo PS”?

Para entender essa metamorfose, é importante recordar as bases ideológicas que sempre distinguiram o PS e o PSD. O PS, um partido de centro-esquerda, enraizado na social-democracia, sempre defendeu uma economia de mercado marcada por uma forte intervenção estatal, focando-se em políticas de bem-estar social, redistribuição de riqueza e inclusão social. Por outro lado, o PSD, apesar de também se autodenominar social-democrata, tem na sua essência uma inclinação mais à direita, privilegiando o liberalismo económico, a iniciativa privada e uma intervenção estatal mais limitada, em consonância com princípios conservadores em termos sociais.

Porém, a política não é estática, e os partidos frequentemente adaptam as suas estratégias para expandir a sua base eleitoral. Com o PS no poder por tanto tempo, o PSD teve que se redefinir, não apenas para se distinguir, mas para sobreviver politicamente. Pois perdeu militantes, líderes influentes e, talvez mais preocupante, uma massa crítica de intelectuais que alimentavam o debate interno e a elaboração de políticas. Esta necessidade de adaptação culminou numa coligação que inclui o Chega, um partido de extrema-direita. Esta aliança, que outrora teria sido impensável, revela uma transformação que vai além de um simples ajuste estratégico – ela questiona a própria essência do PSD.

Quando o PSD Açores, liderado por José Manuel Bolieiro e a sua coligação, assumiu o governo, prometeu uma administração diferente da do PS. A promessa era de um rompimento com o caciquismo, o assédio laboral, a repressão à opinião pública e as pequenas vinganças pessoais contra aqueles que ousam pensar diferente. No entanto, quatro anos depois, o que vemos é um PSD que, em muitos aspectos, se assemelha ao PS que tanto criticou. As práticas caciquistas persistem, e os erros do passado são repetidos, com a agravante de que o PSD prometeu mais e, ao que tudo indica, entrega menos. O partido que prometeu mudar tudo acabou por se tornar o que mais prometeu e menos cumpriu, deixando para a história actual uma imagem de um dos maiores caloteiros da autonomia.

Os jornais têm sido implacáveis, apontando a inércia e a incompetência em todas as frentes e setores. O PSD, que se propunha a ser a antítese do PS, acabou por seguir um caminho similar, politizando a administração pública, desde secretarias e direções regionais até inspeções e conselhos de administração de empresas públicas. Um dos exemplos mais reveladores dessa contradição foi a gestão do tecido empresarial público. Se até Mário Fortuna, presidente da Câmara de Comércio de Ponta Delgada, não poupou críticas, chegando a comparar a governação de José Manuel Bolieiro à de um governo “comunista”. Essa crítica é particularmente irónica, considerando que essa gestão tem o aval do Chega e da coligação, partidos que supostamente estariam em oposição a qualquer forma de controle estatal excessivo.

O caciquismo, por sua vez, é uma ameaça silenciosa que corrói a democracia, especialmente entre as camadas mais jovens. Quando o poder é usado para perpetuar uma elite e reprimir vozes dissidentes, o resultado é o enfraquecimento das instituições e a criação de uma cultura de medo e conformismo. Onde está a voz dos agentes culturais, que este ano voltaram a ver atrasado todo o processo do RJAAC? Em pleno agosto, com um atraso de 8 meses, nem uma voz se ouviu. É este o reflexo do caciquismo.

Portanto, fica a reflexão: até que ponto o PSD, ao se transformar num “Novo PS”, está disposto a comprometer os seus valores e princípios para manter o poder? E mais importante, o que isso significa para o futuro da nossa democracia e para as novas gerações de açorianos? Essas são questões que merecem atenção e debate, pois o futuro dos Açores depende das escolhas que fazemos hoje, e das práticas políticas que aceitamos ou rejeitamos.

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