É recorrente a afirmação da direita e, em particular, da extrema-direita, de que a democracia se iniciou com o 25 de novembro. Mas, sobre este dia, a partir do Brasil, Chico Buarque cantou que Já murcharam tua festa, pá.

Quem ganhou com a ditadura nunca se conformou com Abril. Ainda no próprio dia da Revolução começaram a conspirar nas sombras, procurando impedir ou derrubar as transformações que viriam a ser construídas. Várias ações foram concretizadas nesse sentido, todas falhadas: as tentativas de golpes de 28 de setembro de 1974 e de 11 de março de 1975, o terrorismo bombista no verão de 1975 e outros atos de violência, incluindo assassinatos. Durante o mês de novembro de 1975, as provocações e a violência contra elementos de esquerda e sindicalistas subiram de tom. As agressões contra quem estava inteiramente comprometido com a Revolução tornaram-se mais graves. O 25 de novembro vem nessa sequência. Confessar os seus objetivos implicaria ser travado por quem ansiava pela Paz, pelo Pão, pela Habitação, pela Saúde e pela Educação. Por quem, durante 48 anos, ansiou pela Liberdade!

Quem lutou contra Abril não hesitou em lançar um longo rio de mentiras e deturpações. Destaco três: que se preparava uma ditadura comunista, que se travou uma guerra civil e que o 25 de novembro foi a ação dos moderados, contra os radicalismos. Mas o apoio das organizações fascistas e de extrema-direita ao 25 de novembro tira quaisquer dúvidas quanto às supostas boas intenções e moderação. Quanto às mentiras, foram sendo confessadas pelos próprios, muitos anos depois, podendo ser consultadas em vários livros sobre o assunto.

Os objetivos do 25 de novembro nunca foram alcançados em pleno. Refiro-me, por exemplo, à proibição do PCP ou em impedir a aprovação da Constituição da República. Como se sabe, o PCP não foi proibido. Quanto à Constituição da República Portuguesa, mesmo depois de muito atacada, ainda continua a ser o documento legal mais progressista da Europa. Fosse cumprida por inteiro e a nossa vida seria bem diferente, para melhor.

Poderá ser útil ver o 25 de novembro pelos olhos de quem, hoje, o defende. O PSD mostrou bem o que esteve e está em causa. De manhã, o presidente da Câmara de Lisboa desrespeitou uma decisão democrática do município, ao impor as comemorações do 25 de novembro, depois de a Câmara as ter reprovado. De tarde, defendeu, no congresso do PSD, o fim do Serviço Público de Saúde e de Educação e que o estado seja colocado, inteiramente, ao serviço do privado e da sua sede de lucro.

Efetivamente, as consequências do 25 de novembro deram força a quem conspirava contra a Revolução. Por isso, o 25 de novembro é, sobretudo, daqueles que não perdoam aos Militares de Abril e ao Povo Português terem acabado com a ditadura fascista. Daqueles que, nos 50 anos que se seguiram, foram trabalhando para destruir as conquistas de Abril.

Como se sabe, as comemorações do 25 de Abril ocorrem todos os anos e em todo o país, juntando centenas de milhares de Portugueses. Bem sei que não conseguirão esclarecer, mas deixo na mesma uma questão simples: como é que os que atribuem tanto mérito ao 25 de novembro explicam a total ausência de manifestações populares para celebrar o dia em que dizem ter começado a democracia?

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