As ameaças de uso de armas nucleares feitas por vários responsáveis russos devem ser levadas a sério, defendeu à Lusa o ministro dos Assuntos Europeus da Finlândia, justificando o contínuo investimento em Defesa do mais recente membro da NATO.
Com a Finlândia a partilhar uma fronteira com a Rússia ao longo de 1.300 quilómetros (quase tanto quanto a Ucrânia), governante considerou, questionado sobre como é que vê a possibilidade de uma escalada nuclear devido ao conflito na Ucrânia, serem “especialmente preocupantes” as ameaças feitas, por exemplo, pelo antigo primeiro-ministro russo Dmitri Medvedev.
”É significativo cada vez que um país assim preponderante equaciona sequer utilizar armamento nuclear. Não podemos dar-nos ao luxo de dizer que não interessa ou que é insignificante”, considerou Anders Adlercreutz, em entrevista à Lusa.
A ameaça nuclear faz parte na narrativa do Kremlin e dos seus aliados desde o início da invasão à Ucrânia, em 24 de fevereiro do ano passado. De Medvedev ao Presidente russo, Vladimir Putin, as ameaças mais ou menos veladas intensificam-se a cada tranche de apoio que os países ocidentais disponibilizam às tropas ucranianas.
Em março deste ano, por exemplo, Putin anunciou que ia colocar ogivas nucleares táticas na Bielorrússia. Há cerca de um mês, terá começado a transportá-las para o território do país aliado, que faz fronteira com vários países da Aliança Atlântica e da União Europeia (UE).
Nos programas de debate com maior audiência da televisão russa, é frequente ouvir comentadores e analistas sugerirem que a Rússia lance um ataque nuclear às principais capitais europeias, para penalizá-las pelo auxílio prestado à Ucrânia na sequência da invasão russa no país.
A Rússia rivaliza com os Estados Unidos pelo maior arsenal nuclear do mundo. Embora o tratado entre as duas potências nucleares que permitia o controlo e verificação dos respetivos arsenais tenha sido outra das ‘vítimas’ da atual guerra, de acordo com Boletim dos Cientistas Atómicos a Rússia tem hoje aproximadamente 4.489 ogivas nucleares, quase mais 1.000 do que os Estados Unidos.
A Finlândia, completou Anders Adlercreutz, fez os possíveis para precaver qualquer cenário, incluindo o nuclear, ciente da ameaça representada pela Rússia.
“A abordagem finlandesa à segurança ganhou alguma atenção. A Finlândia não desmantelou o seu exército, não o diminuiu, depois da Guerra Fria. Progredimos, desenvolvemos as nossas capacidades militares e as próprias Forças Armadas. Acreditámos que a história não tinha acabado, como disse Francis Fukuyama [filósofo], e que é melhor estar em segurança do que lamentar”, disse o ministro à Lusa, que na semana passada participou numa conferência na ilha Terceira, nos Açores.
Em abril deste ano, Helsínquia tornou-se o 31.º Estado-membro da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), naquele foi que o processo de adesão mais rápido na história recente da aliança político-militar com quase 75 anos.
Motivada pelo receio de uma expansão da invasão russa para o território finlandês, concluída rapidamente e com elogios do secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg.
A cooperação entre os países da NATO e a Finlândia é antiga e as Forças Armadas finlandesas estão dotadas de capacidades avançadas. A Finlândia tem cerca de 24.000 militares no ativo e uma reserva de 900.000, relevante para um país com uma população de pouco mais de cinco milhões de pessoas.
“Se houvesse um conflito, já possuíamos um sistema dentro da nossa sociedade em que todos trabalhariam em conjunto. Não só as nossas Forças Armadas estão a trabalhar em conjunto, como também trabalham com o setor privado e com a sociedade civil”, sustentou Adlercreutz.
Em Helsínquia, já se discute a construção de abrigos de bombardeamentos para a população, segundo o ministro dos Assuntos Europeus finlandês.
Nos últimos anos discutia-se sobre “se a ideia de construir abrigos contra bombardeamentos em cada edifício novo era uma ideia desatualizada” em função de uma nova ideia de paz, o que “levaria, por exemplo, a uma descida no preço da habitação”.
“Essa discussão já não existe”, quase 18 meses depois da invasão russa da Ucrânia, sustentou.
Já ao nível da UE, o ministro reconheceu que apoiar a Ucrânia como os 27 têm feito desde o ano passado é a melhor maneira de assegurar que não há uma escalada do conflito.
“Eu acho que a UE tem poucas ferramentas à disposição no que diz respeito a [evitar] uma escalada. Acho que se a Rússia decidir fazê-lo, e assim decidiu no último ano e meio, vai acontecer”, disse Adlercreutz.
“Não acredito que a UE, ou a Finlândia, tenham outra escolha que não seja apoiar a Ucrânia”, considerou.