Melhoria das condições de vida não acaba com o discurso de ódio

A professora da Universidade de Harvard Susan Benesch defendeu hoje que o discurso de ódio é uma “ameaça real” à democracia, alertando que não basta melhorar as condições de vida para terminar com aquele discurso.

“Nós também vemos discurso de ódio em pessoas cujas condições de vida não são nada difíceis. Infelizmente, mesmo olhando para outros exemplos na história, as condições de vida não parecem ser o fator determinante relacionado com o ódio”, afirmou.

A investigadora do Berkman Klein Center for Internet & Society da Universidade de Harvard falava à agência Lusa e à Antena 1, a propósito da conferência internacional “Discurso de ódio: como contra-atacar?”, que decorreu na Universidade dos Açores, em Ponta Delgada, organizada pelo CICS.NOVA.UAc (Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais).

Susan Benesch defendeu que o discurso de ódio utiliza o medo para “convencer que um determinado grupo de pessoas” representa uma ameaça à ordem social, fazendo com que “as pessoas, mesmo as que têm boas condições económicas, se sintam ameaçadas”.

“O discurso de ódio consegue convencer um grupo de pessoas a temer um outro grupo de tal forma que eles acreditam que violência é aceitável ou mesmo necessária. Isto é uma ferramenta muito eficaz para tornar o grupo mais coeso, de tal forma que os líderes políticos usam bastante”, realçou.

A antiga jornalista norte-americana, que dirige o “Dangerous Speech Project” (um projeto sobre discursos perigosos) considerou que o discurso de ódio é uma “ameaça real”, alertando que “aqueles que pretendem preservar a democracia não podem relaxar”.

“Para mim, o discurso de ódio é um sintoma. É um indicador da sociedade. Em parte porque as pessoas geralmente se sentem desinibidas ‘online’ para expressar o que há 30 ou 40 anos não expressavam de forma pública”, declarou.

Em vez da “censura”, Susan Benesch defendeu que o discurso de ódio deve ser combatido através de um “contra discurso” que “force a sociedade a olhar” para o assunto e “admitir o problema”.

“A maior parte das pessoas que decide contra-atacar o discurso de ódio não está a tentar mudar o pensamento de quem o promove. Em vez disso, estão a tentar mudar a sociedade em geral e a mudar a perceção da audiência”, realçou.

Pilar Damião de Medeiros, professora da Universidade dos Açores, avisou por seu lado que o “discurso de ódio não conhece diálogo” e procura, “simplesmente, menorizar minorias ou outros grupos sociais”, instigando a xenofobia, a homofobia a misoginia e o racismo.

“Em Portugal, quando estamos perto das celebrações dos 50 anos da liberdade conseguida com muito custo, estamos com a extrema-direita a espreitar. A meu ver, parece que os monstros que julgávamos extintos desde da II Guerra Mundial estão novamente a espreitar”, declarou.

Considerando que o “ruído das extremas-direitas” não tem “nem bases, nem dados concretos”, a socióloga, que integrou a organização do evento, afirmou que a conferência pretendeu “motivar o debate sobre o perigo de viver numa era em que o ódio cresce de forma acutilante”.

“Temos de ser ativistas diariamente nesta luta contra o discurso de ódio em todas as suas variantes. Se queremos manter a nossa democracia viva, os valores de justiça social e o respeito pela dignidade humana, tem de ser com um trabalho feito por todos nós”, concluiu.

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