As touradas à corda na ilha Terceira, nos Açores, que arrancam na segunda-feira, continuam a atrair milhares de participantes e os ganadeiros acreditam que, se depender da vontade da população, têm futuro assegurado.

“É um marco da nossa identidade. Faz parte da nossa história, da nossa cultura, identifica-nos como povo. Na ilha Terceira, as pessoas identificam-se muito como sendo taurinas. A tourada à corda vem de há muitos séculos marcando o nosso percurso de vida”, afirmou, em declarações à Lusa, a presidente da Associação Regional de Criadores de Toiros de Tourada à Corda, Sónia Ferreira.

Na ilha Terceira, entre 01 de maio e 15 de outubro, realizam-se, por norma, mais de 200 touradas à corda, manifestações em que o touro corre nas ruas, amarrado por uma corda, abertas à população, sem cobrança de ingressos.

No mês de maio estão já agendadas 15 touradas na ilha, chegando a realizar-se várias no mesmo dia.

Para Sónia Ferreira, só as imposições legais podem ameaçar a tourada à corda, porque, “se depender da população, não vai morrer”.

“Se se começar com legislação europeia, não necessariamente que proíba, mas que dificulte a criação de gado bravo, que dificulte a realização de eventos, por exemplo, proibindo as crianças de ir a eventos taurinos, taxando com IVA máximo (…) Tudo o que sejam políticas que vão penalizando a tauromaquia podem danificar e hipoteticamente terminar com as touradas”, alertou.

O historiador Francisco Maduro-Dias acredita que as touradas à corda foram introduzidas na ilha Terceira pelos povoadores, mas evoluíram, enquanto noutros locais do país deixaram de se realizar.

“Eu acho que a gente trouxe e manteve. Claro que a tourada à corda de agora não é a tourada à corda de há 100 anos”, adiantou.

As camisas dos ‘pastores’, que seguram a corda do touro, praticamente iguais à “camisa habitual do século XVII”, são um indício de que a manifestação já se realiza há vários séculos.

Quando questionado sobre o porquê de se ter mantido na ilha Terceira, Maduro-Dias respondeu: “Eu quase que perguntava porque é que desapareceu de outros sítios, porque estou convencido de que outros lugares tinham”.

“Durante muito tempo, a nobreza, a administração, estava mais em Angra e na Terceira. O replicar e o reproduzir comportamentos habituais do continente permaneceu naturalmente mais cá do que noutras ilhas”, apontou.

E porque mantém uma elevada adesão? Porque continua a desempenhar o seu papel e porque se assume como uma “marca” da ilha Terceira, segundo o historiador.

“Funciona como momento de diversão, de demonstrar agilidade, de demonstrar juventude, de sentir a vida”, sublinhou.

Para Francisco Maduro-Dias, os açorianos são “clássicos no meio do Atlântico” e a tourada à corda integra “elementos tradicionais da cultura clássica”.

“É uma tourada, mas é o brincar com o toiro, brincar com o selvagem. A prova da inteligência humana versus a força bruta. São uma quantidade de valores clássicos grego-latinos que nós usamos e que temos entre nós, que acabam por ser de base. Nem o toiro pode ser desrespeitado, nem o ser humano pode ser gozado. É uma convivência entre o selvagem e o civilizado, entre a força bruta e a inteligência”, explicou.

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