Sou portuguesa e açoriana, classe média (aquela classe “demasiado rica” para ter acesso a quaisquer facilidades e “demasiado pobre” para viver folgadamente). Faço parte da diáspora açoriana, vivo, por questões profissionais, no continente, mas todos os anos regresso às ilhas para visitar familiares e descansar.

Construí uma casa nos Açores, que não é uma segunda casa, é a minha única casa! (com recurso a crédito… que ainda está a ser pago). Pago IMI, e sou uma consumidora normal enquanto estou nos Açores!

O problema é que em termos de viagens sou, como todos os que se encontram na minha posição, a exceção. Faço parte dos que são altamente explorados, quase que se poderia dizer roubados, de cada vez que compro voos para a terra onde nasci!

Ora vejamos:

– Os açorianos residentes têm acesso a passagens fortemente subsidiadas, numa lógica perversa e imoral. E digo Imoral porque as duas companhias regulares que voam para os açores, a SATA e a TAP (quer por uma concertação de preços, que se sabe ser ilegal, quer por processos de “espionagem”) praticam preços muito semelhantes e elevadíssimos (se comparados com outros destinos europeus com voos de duração semelhante) que, depois, são altamente comparticipados pelo Governo Regional, com dinheiros públicos retirados dos impostos de todos nós. Todos sabemos que há viagens para os Açores que custam 10 vezes mais que algumas para Londres, Paris ou Roma. (e todos supomos que os voos para estes destinos são rentáveis!). E, no fim, cada passageiro/residente paga do seu bolso, para se deslocar a Lisboa ou Porto, algo entre 99€ (se estudante) e 134€ (se residente ou equiparado).

Ou seja, os residentes nos açores pagam para vir a Lisboa ou Porto, valores semelhantes a viagens de Lisboa para Londres, Paris ou Roma, sem que estas tenham quaisquer subsídios!

Perante isto, impõe-se perguntar: será mesmo necessário subsidiar estes voos? Ou, porque é que os voos de duração semelhante para vários destinos na Europa, sendo mais baratos, são rentáveis? (e os voos para os Açores não o são). Ou, ainda, porque é que é possível (dependendo das datas) encontrar voos Lisboa-Açores com valores semelhantes a um Lisboa-Nova Iorque ou um Lisboa-Boston?

Enquanto esta lógica existir a TAP e a SATA, em vez de praticarem preços ajustados aos voos, como o fazem para outros destinos, continuarão a praticar preços que lhes permitem encaixar valores absurdos de cada vez que uma aeronave descola de qualquer das ilhas. (quer através de subsídios, quer através de preços abusivos).

– Por outro lado, temos os portugueses residentes no continente que podem deslocar-se aos açores, de férias, por alguns dias, comprando alguns pacotes com valores inferiores a 190€, mas, pasme-se, com alojamento incluído. Aqui, impõe-se perguntar: Tratando-se de voos de ida e volta, qual o valor real destes voos?- Temos ainda os estrangeiros, turistas, cujos valores das viagens, não sendo propriamente baratas, são muito provavelmente compatíveis com os ordenados dos países onde vivem.

– E, por último, estamos nós, também açorianos, nascidos nas ilhas, mas que vivem longe, que tem os dias de férias condicionadas pela entidade patronal (ou seja, sem grande flexibilidade em termos de datas) e que auferem ordenados portugueses, que não precisam de alojamento porque tem as suas casas (ou de família) e que são, afinal, aqueles para quem os valores de voos para os Açores são absolutamente proibitivos. Ou seja, saem fortemente penalizados neste jogo de interesses ou de falta de transparência.

Uma breve pesquisa permite encontrar algumas datas cujos valores de, por exemplo, um voo Lisboa-Pico (apenas num sentido) são superiores a 300€, aproximando-se por vezes dos 400€. Se pensarmos que há que regressar ao continente, e que há famílias de 3 ou 4 pessoas, é fácil compreender o que sentem estes açorianos e as suas famílias.

Onde está o limite? …de preços e de decência!

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