O Ecomuseu do Corvo ajudou a recuperar a tradição da tecelagem e, 55 anos depois, a mais pequena ilha dos Açores volta a ter tecelãs no ativo, que produzem pequenas peças de artesanato, como almofadas e bolsas.
“Iniciámos, desde 2022, um trabalho de recuperação tanto das memórias, como das vivências e tradições. Mas, gostaríamos muito que este ofício, que estava extinto, deixasse de ser memória para ser também património imaterial”, disse à agência Lusa a diretora do Ecomuseu do Corvo, Deolinda Estêvão.
O ofício da tecelagem perdurou no Corvo durante séculos e foi essencial à sobrevivência da comunidade corvina.
Na ilha eram produzidas roupas e agasalhos e foi-se aperfeiçoando o ofício, que perdurou até à segunda metade do século XX, mais precisamente até 1969, ano em que se realizou o último “Dia da lã” e, como consequência, o fim da tecelagem.
“No passado, eram produzidas peças utilitárias de vestuário e inclusivamente o foro, o imposto, era pago à coroa em pano de tecido. Tinham que ser pagos cerca de 880 metros de lã anualmente à coroa”, explicou a diretora do Ecomuseu.
No entanto, “pouco restou” daquele património imaterial, para além dos lugares e objetos de memória, e dos testemunhos orais, agora recuperados.
O EcoMuseu do Corvo lidera o projeto para reavivar o ofício e manter viva a tecelagem, tendo adquirido um tear para desenvolver os processos formativos.
Integrado no plano de atividades, o espaço museológico desenvolve, desde 2022, ações de recolha e capacitação da comunidade, que vão desde a identificação e mapeamento de locais onde se tosquiava, cardava, tingia ou tecia, inventário dos utensílios que ainda existem na ilha associados à tecelagem, a par da recriação do “Dia da lã” e ações de formação, com Fernando Pereira, que se desloca à ilha do Corvo.
“Com a colaboração de diversos agentes, onde a comunidade assume um papel muito importante, e com esses processos de capacitação, conseguimos formar um grupo de oito senhoras e conseguimos que uma jovem se motivasse e abraçasse novamente este ofício. Por isso, podemos dizer hoje que a tecelagem na ilha do Corvo deixou de ser memória e passa a ser novamente património imaterial”, sublinhou a responsável.
Segundo Deolinda Estevão, há agora uma tecelã certificada e registada desde 09 de junho no CADA (Centro de Artesanato e Design dos Açores) como artesã da ilha do Corvo dedicada à tecelagem.
“Isto é um marco histórico, porque desde 1969 a tecelagem extinguiu-se na ilha. Passados estes 55 anos temos novamente a tecelagem viva e podemos dizer que faz parte novamente do património imaterial do Corvo”, assinalou Deolinda Estêvão.
Além de Zita Mendes, que ficará “para a história do Corvo como a primeira de muitas que a seguir virão”, como tecelã credenciada, também a mãe abraça a arte, segundo a diretora do Ecomuseu.
“Não temos dúvidas, que revitalizaram um saber extinto, que pertencia à memória coletiva da comunidade, para o transformar em património imaterial. Temos agora duas tecelãs no ativo que estão a produzir pequenas peças de artesanato”, reforçou.
Para já, a produção passa por pequenas peças que são comercializadas localmente, até porque a lã usada na confeção não é originária da ilha, mas adquirida na zona da Serra da Estrela.
A ilha só tem atualmente um criador de ovelhas, mas a diretora do Ecomuseu adiantou que o espaço museológico está também a investir em processos de capacitação para retomar a produção local de lã e formação na área da fiação, lavagem da lã e tinturaria.
Como outro projeto “mais ambicioso”, a responsável revelou a intenção de ser criada uma Casa dos Teares, com um percurso museográfico e a laboração de teares ao vivo.
“O Ecomuseu é o catalisador para que a comunidade se aproprie novamente desses processos”, disse a responsável, sublinhando que esta é também uma forma de revitalizar a economia local da ilha com cerca de 400 habitantes.