O parlamento dos Açores rejeitou hoje por maioria o projeto de decreto legislativo que determinava o fim das touradas e previa apoios aos trabalhadores e à reconversão das praças de touros, apresentado pelo Pessoas-Animais-Natureza (PAN).
A proposta, apresentada pelo deputado único do PAN Pedro Neves, foi rejeitada na votação na generalidade com 25 votos contra do PS, 21 do PSD, três do CDS-PP, dois do PPM, um do Chega, um da IL e outro do deputado independente e com dois votos a favor do BE e um do PAN.
Pedro Neves justificou a proposta por a evolução cultural e social reclamar “a revisão da classificação de práticas que durante algum período histórico foram apelidadas de cultura, mas que agora são apontadas como tortura devido ao nível de sofrimento infligido aos animais em resultado da prática de atos cruéis, incompatíveis com os valores contemporâneos de respeito e compaixão pelos animais”.
Na intervenção, realizada no segundo dia do último plenário do parlamento dos Açores, na Horta, antes do debate do Plano e Orçamento para 2024 (agendado para novembro), Pedro Neves questionou: “Que satisfação tem o humano ao ver um animal ser gozado e maltratado? Que satisfação tem o humano ao ver um animal morrer em plena praça pública?”.
Na sua opinião, “estas questões deviam ser suficientes para compreender a necessidade de abolir todas e quaisquer práticas tauromáquicas” (no caso dos Açores touradas de corda ou de praça), alegando ser “inconcebível que se continue a recorrer à tradição, à arte e à cultura como argumentos”.
Na discussão do assunto, a deputada do BE Alexandra Manes, partido que votou ao lado do PAN, referiu que “estas tradições foram abolidas por muitos países”.
Também lembrou que nas audições que antecederam o debate parlamentar, “ficou provado que ninguém, nenhuma entidade vive exclusivamente da prática das touradas” e têm outra atividade que garante rendimentos pelo que, a sua abolição “não represente despesa para a região”.
Luís Soares (PSD) referiu que no passado dia 15 terminou a época tauromáquica na região dos Açores e que quem observa esta prática anual em algumas ilhas “fica a perceber a dimensão deste fenómeno” com “ruas apinhadas de gente” e com a participação de muitos jovens.
Pelo PSD também se pronunciou João Bruto da Costa, que observou que a tourada “não é tortura” e é uma prática com “muitas manifestações de arte”.
Ainda da mesma bancada, Paulo Silveira salientou que na ilha de São Jorge, onde a tauromaquia tem expressão, existem oito ganadarias ativas com mais de 400 cabeças de gado bravo.
O deputado socialista Berto Messias referiu que alguns pressupostos da proposta do PAN “são errados” e “é inquestionável o peso económico” da tradição tauromáquica no arquipélago.
Já o deputado do Chega José Pacheco alertou que “não se pode fazer uma lei que vai contra a vontade do povo”.
Segundo Nuno Barata (IL), “de Santa Maria ao Corvo, em todas as nove ilhas dos Açores, existem aficionados”, sendo que o maior número está na Terceira, São Jorge e Graciosa.
Por sua vez, Paulo Estevão (PPM) lembrou que nos Açores, em particular nas ilhas com maior presença, “essa tradição tem um grande apego popular”.
Pedro Pinto (CDS-PP) recebeu a proposta do PAN como “mais uma tentativa” daquele partido para acabar com a cultura açoriana.
O independente Carlos Furtado alertou que caso a iniciativa fosse aceite “daqui a nada não vamos ter nada que nos identifique”.
Sobre o assunto, o secretário Regional da Agricultura, António Ventura, disse que o executivo aceitaria a decisão do parlamento, mas advertiu: “Estou em crer que os que gostam [de touradas] superam em grande maioria os que não gostam, pelo que o futuro da tauromaquia nos Açores está assegurado”.
Lembrou ainda tratar-se de uma arte que encerra “valores, tradições e raízes” do povo açoriano e que a raça bovina de raça brava está presente em oito das nove ilhas (cerca de 2.300 animais).