A secretária da Saúde dos Açores, Mónica Seidi, alertou hoje para os problemas que uma eventual restrição no exercício de cargos de direção médica podem gerar em algumas unidades de saúde da região.

“Reduzir o universo de pessoas ou dar vantagem a médicos que só estejam em regime de exclusividade vai fazer com que, se calhar, não tenhamos pessoas suficientes para integrarem as comissões de serviço que já existem”, advertiu a governante, ouvida na Comissão de Assuntos Sociais do parlamento açoriano, a propósito de uma resolução do PAN sobre a criação de “critérios para a nomeação de cargos de direção médica”.

De acordo com a proposta do deputado Pedro Neves, do partido Pessoas-Animais-Natureza (PAN), os diretores de serviços das unidades de saúde do arquipélago devem ser especialistas com a categoria de assistente graduado e, preferencialmente, profissionais que não acumulem funções em clínicas privadas.

Mónica Seidi explicou aos deputados que nos Açores “não é incompatível” que os médicos acumulem funções entre o setor público e o setor privado, mas admitiu que possa ser necessário tornar esses casos mais “transparentes”, obrigando os médicos a declararem as situações de acumulação de funções.

“Tem de ser entregue essa declaração, esse compromisso de honra, junto dos conselhos de administração, e nessa declaração deve ficar explícito o local onde trabalha e o horário onde presta esse serviço, de forma a termos a certeza que não há aqui qualquer tipo de incompatibilidade”, insistiu a secretária regional da Saúde.

A governante adiantou ainda que as únicas exigências que a região pode fazer, nesta matéria, incidem apenas sobre o trabalho médico desenvolvido no Serviço Regional de Saúde, ressalvando que, em relação ao privado, ninguém tem “nada a ver com isso”.

“Nós não devemos estar preocupados em quantos sítios o médico trabalha ou se trabalha aqui ou se trabalha acolá. Não. Nós devemos estar preocupados que, durante o horário normal de trabalho, o médico cumpra com aquilo que está estipulado. O que é feito fora do horário de trabalho não temos nada a ver com isso”, frisou.

A proposta do PAN entende, porém, que é do total interesse público “minorar eventuais conflitos gerados pela acumulação de funções públicas e privadas em cargos de decisão”, defendendo, por isso, que se dê “um forte sinal” no sentido do “reconhecimento efetivo do trabalho médico público exclusivo”.

“É certo que a atividade privada nem é sempre, nem é de todo, incompatível com a simultânea atividade pública, quando o médico atua sob os mais puros princípios éticos e deontológicos, mas existem casos de difícil julgamento, ou que levantam eventuais dúvidas sobre a existência de um certo conflito de interesses”, pode ler-se no projeto de resolução do PAN.

Estas exigências têm, no entanto, o apoio do presidente da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares, Xavier Barreto, também ouvido pela Comissão parlamentar de Assuntos Sociais, que lembrou que muitas destas medidas já fazem parte da legislação nacional.

“Existe sim, tal como está previsto nesta proposta, a necessidade de o médico não poder acumular a direção de serviço do hospital com, por exemplo, a direção de um serviço de um hospital privado ou do setor social, o que se compreende por razões óbvias”, justificou Xavier Barreto, acrescentando que poderá haver casos de “conflito de interesses”.

Mas o responsável pelo Gabinete de Prevenção contra a Corrupção nos Açores, Francisco Cota Lima, que também foi ouvidos pelos deputados, entende que as exigências que o PAN pretende introduzir nas nomeações para cargos de direção médicas na região poderão dificultar a contratação de profissionais de saúde nas ilhas mais pequenas.

“Consigo aqui antever que alguns destes pontos poderão não ser aplicáveis a determinadas unidades de saúde”, advertiu Francisco Cota Lima, dando o exemplo dos centros de saúde de Santa Maria, da Graciosa, de São Jorge, das Flores e do Corvo, que “poderão vir a ter dificuldade na nomeação de cargos de direção clínica”.

A Comissão de Assuntos Sociais da Assembleia Legislativa dos Açores tinha prevista também a audição de um representante da Ordem dos Médicos, sobre a proposta do PAN, mas a instituição optou por enviar, mais tarde, um parecer por escrito sobre esta matéria.

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