A queda de cerca de 12% nas candidaturas de acesso ao ensino superior face ao ano passado não deve ser vista como uma surpresa mas sim um alerta. Há alguns anos que vários sinais são evidentes e, finalmente, começaram a refletir-se de uma forma mais clara.

O número de estudantes colocados na primeira fase é consideravelmente baixo, se tivermos em linha de consideração as candidaturas da última década no que concerne ao ensino superior. Essa realidade tem implicações muito sérias para o país. Portugal não se pode dar ao luxo de perder capital humano qualificado, sobretudo numa economia que já sofre com a falta de quadros especializados e também com a fuga de talento para o estrangeiro.

Mais do que os números, preocupam-me os desequilíbrios que se tornam cada vez mais visíveis. A diminuição de candidatos ameaça a sustentabilidade de várias instituições e coloca em causa a coesão territorial. Quando as vagas ficam por preencher e os jovens optam por não estudar longe das áreas metropolitanas, o resultado e um círculo vicioso com menos alunos, menos investimento e, inevitavelmente menos futuro para regiões que já lutam contra a desertificação.

Outro dado que considero particularmente inquietante é a quebra no número de estudantes provenientes de meios mais carenciados. Apesar de todas as medidas criadas para favorecer a sua entrada e permanência no ensino superior, a verdade é que a desigualdade continua a ser um obstáculo praticamente intransponível. O custo dos alojamentos, as despesas associadas a viver fora de casa e a fragilidade dos apoios sociais tornam o ensino superior inacessível a muitos. Neste ponto, o sistema falha no seu papel essencial de elevador social e corre o risco de se transformar num mecanismo de reprodução de desigualdades.

O futuro não me parece animador se não houver uma mudança de estratégia, se não houver maturidade política para o efeito. Esta problemática não envolve apenas o governo mas sim toda a classe política. Com menos jovens, a cada ano, será inevitável que aumente a pressão sobre as instituições de ensino. A internacionalização tem sido e pode continuar a ser parte da resposta, mas não basta importar estudantes para compensar a quebra que os dados mais recentes anunciam. É preciso garantir que o ensino superior em Portugal continua a ser inclusivo, acessível e atrativo, independentemente da origem social dos candidatos.

A diminuição nas candidaturas é, em última análise, um sintoma de fragilidades profundas no nosso país, desde a queda na demografia, as desigualdades e o financiamento insuficiente. É por isso que acredito que o debate não pode ficar centrado na percentagem em si, mas nas escolhas políticas que são feitas a partir dela.

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