PUB

A Universidade dos Açores está a desenvolver um projeto de produção de biocarvão com origem em espécies invasoras, como conteira, criptoméria e algas, para sequestrar carbono e mitigar as alterações climáticas.

“Tivemos ótimos resultados. Conseguimos produzir o material e agora estamos na parte de fazer os testes para entender como é que ele funciona no solo e nas plantas. A ideia é que a gente o implante no solo e que ele traga benefícios, mas também que ajude no sequestro do carbono”, explicou, em declarações à Lusa, a professora Osania Ferreira.

Doutorada em microbiologia agropecuária, Osania Ferreira, docente da Universidade do Estado de Minas Gerais, no Brasil, está a fazer um pós-doutoramento na Faculdade de Ciências Agrárias e do Ambiente da Universidade dos Açores, em Angra do Heroísmo.

PUB

Há três meses que está a estudar a possibilidade de aplicar nos Açores uma metodologia que já desenvolveu no Brasil para produzir biochar (biocarvão) a partir de resíduos da cana do açúcar.

No arquipélago, em vez da cana do açúcar, está a trabalhar com espécies invasoras como conteira, cana, criptoméria e algas.

“É uma tecnologia promissora. Das que a gente tem no mercado é aquela em que se consegue sequestrar uma maior quantidade de carbono e mantê-lo imobilizado por mais tempo”, avançou a investigadora.

O objetivo é, por um lado, mitigar as alterações climáticas, com o sequestro de carbono no solo, e, por outro, controlar as espécies invasores nos Açores.

“A ideia é tirar o carbono que hoje está na atmosfera e incorporar no solo por longos períodos. Este carbono, produzido através do biochar, é recalcitrante e então vai demorar muito tempo a ser degradado”, explicou Osania Ferreira.

Segundo a investigadora, o biochar tem várias utilizações possíveis, desde a produção de asfalto ao tratamento de águas residuais.

Nos Açores, para além da incorporação direta nos solos, pode ser utilizado na alimentação de bovinos.

“Ele ajuda a regular a microbiota, melhorando a imunidade do animal e fazendo com que ele emita menos metano”, apontou a docente.

Numa região em que a agropecuária é um dos setores com maior impacto na emissão de gases com efeitos de estufa, o biocarvão daria também um contributo para a redução de metano produzido pelas vacas.

“A ideia é conseguir criar dentro do sistema da ilha um produto que vai fazer com que se consiga ter uma agricultura e uma pecuária de baixo carbono, utilizando espécies invasoras, que hoje são um problema para o sistema. Vamos estar a resolver dois problemas com uma única tecnologia”, vincou a investigadora.

João Madruga, doutorado em ciências agrárias e investigador do Instituto de Investigação e Tecnologias Agrárias e do Ambiente (IITAA) da Universidade dos Açores, é supervisor do pós-doutoramento de Osania Ferreira.

O docente defendeu que esta tecnologia poderá ser utilizada também com as podas das vinhas nos Açores, que uma vez transformadas em biochar podem ser integradas no terreno das videiras.

“A maior parte das vinhas são queimadas. Além de destruirmos um produto, estamos a libertar CO2 [dióxido de carbono] para a atmosfera”, alertou.

Esta solução permitiria criar um vinho que fosse não só biológico, mas de baixo carbono, uma característica que já começa a ser procurada por consumidores com maiores preocupações ambientais.

O investigador salientou que os resultados dos ensaios que estão a ser realizados são “muito promissores”, mas é preciso financiamento para produzir em grande escala.

“Estamos a produzir num laboratório em pequena escala. Os resultados são muito bons. Quando falamos em ir para o campo e produzir no campo precisamos de mais volume de material”, explicou.

João Madruga espera que abram em breve candidaturas para projetos de iniciativa empresarial, que permitam dar continuidade ao trabalho já desenvolvido.

“Estamos à espera que este processo possa ser acarinhado pelo Governo [Regional]”, frisou.

PUB