Ao longo dos últimos dias, temos assistido a duas situações controversas que emergiram no panorama político português, e que geraram um amplo debate acerca da ética e transparência dos partidos políticos: o caso das malas do deputado (agora não inscrito) Miguel Arruda, ex-Chega, e o despedimento de funcionárias do Bloco de Esquerda, cujos motivos contrariam aquilo que são os fundamentos ideológicos basilares do partido em questão.
No caso de Miguel Arruda, o escândalo rebentou quando, alegadamente, terá sido detido por se apoderar de malas de viagem que não lhe pertenciam. Este incidente chocou a opinião pública, uma vez que não está em causa apenas o comportamento em si, mas toda uma conduta de um representante político eleito pelo povo, e que impacta, de sobremaneira, a credibilidade da classe política regional e nacional. As investigações estão em curso, mas é certo que há um cenário de incompatibilidade total entre aquilo que é a gravidade das acusações e o exercício público de funções enquanto deputado da nação.
No que diz respeito ao Bloco, o escândalo toma proporções diferentes, na medida em que foi o próprio partido a comprometer os seus padrões éticos. O despedimento de mulheres recém-mães, sendo que uma delas tinha um bebé de dois meses, é claramente um caso que enfraquece a confiança nas instituições políticas e nos seus representantes. Além disso, o caso ganhou especial relevância quando, para contornar a lei, o partido terá dado contratos a prazo sem funções, para que o salário servisse de indemnização. Quando as figuras públicas falham em cumprir aquilo que os cidadãos esperam deles, aumenta o ceticismo em relação à própria democracia.
É precisamente aqui que entra, mais uma vez, o fenómeno da desconsolidação da democracia. Este fenómeno manifesta-se naquilo que é o afastamento dos cidadãos da política, bem como na crescente indiferença em relação à participação democrática. Casos como o de Miguel Arruda ou o do Bloco de Esquerda são sintomáticos de um problema maior: a perceção de uma classe política desalinhada com os princípios de verdade, responsabilidade e transparência, fundamentais ao exercício de funções públicas.
É necessário um esforço coletivo, de partidos e políticos que os compõem, no sentido de assegurar um compromisso com os valores fundacionais da democracia. Estes casos representam desafios graves, mas também uma oportunidade de reflexão profunda sobre o que queremos e devemos exigir aos nossos representantes, bem como às instituições políticas. O futuro da política, em Portugal e no mundo, depende sempre dos cidadãos. Saibam eles exigir mais ética, responsabilidade e coerência.