O tema desta semana refere-se a algo que já todos esperávamos que acontecesse, só não sabíamos quando. França encontra-se, mais uma vez, mergulhada numa profunda crise política. A recente queda do governo liderado por Michel Barnier, fruto de uma moção de censura bem-sucedida, expôs a fragilidade das instituições e o desgaste político que aquele país enfrenta. O presidente francês, Emmanuel Macron encara agora um desafio sem precedentes para restaurar a estabilidade política, se é que isso é possível, num momento em que a polarização social e as pressões económicas e políticas ameaçam a coesão nacional. Estará o presidente francês arrependido de dissolver o Parlamento depois do resultado das eleições europeias? Nunca saberemos.
A nomeação de Michel Barnier como primeiro-ministro francês tinha como objetivo reforçar o diálogo político e ampliar a base de apoio de Macron no Parlamento, altamente fragmentado desde as eleições legislativas de 2022. Barnier, figura respeitada no contexto político francês, procurou conciliar interesses divergentes entre os partidos com assento parlamentar. Contudo, essa tentativa revelou-se insuficiente.
Na minha opinião existem quatro fatores que determinaram a queda do elenco governativo francês. A primeira razão tem a ver com as medidas de austeridade propostas, nomeadamente no que diz respeito a cortes no orçamento. As políticas propostas nesse âmbito foram vistas como um ataque a direitos adquiridos pela classe trabalhadora.
A segunda razão para o fracasso de Barnier é a polarização no contexto parlamentar. Ora, a Assembleia Nacional tornou-se num autêntico campo de batalha entre forças ideológicas incompatíveis, com alianças ocasionais entre extrema-esquerda, extrema-direita e outros partidos menores para travar o avanço de projetos do governo.
A terceira razão que identifico para a queda de Barnier é algo que já tenho alertado de forma recorrente, o declínio da confiança pública. O descontentamento popular, refletido em greves e manifestações regulares aumentou a pressão sobre o Executivo francês.
Finalmente, as tensões no seio do próprio governo francês, no que concerne à direção das reformas e da estratégia política fragilizaram a liderança de Barnier. A moção de censura aprovada por uma coligação algo improvável de opositores foi o culminar dessas tensões, forçando a demissão do primeiro-ministro e colocando Macron numa posição delicada.
Que caminhos dispõe Macron? O mais obvio e direto, seria a dissolução do Parlamento e convocar novas eleições, algo que Macron já disse que não faria. Além disso, esta possibilidade poderia fragmentar ainda mais o Parlamento francês, numa altura em que as sondagens sugerem um crescimento de forças populistas. Outra opção seria a formação de um governo de unidade nacional, através da integração de membros de várias fações políticas com o objetivo de estabilizar o país e aprovar reformas essenciais. No contexto político atual, parece uma solução altamente improvável. Não tenho uma solução rápida e direta para esta situação, aquilo que faço é procurar indicar alguns caminhos que coloquem no centro da ação política o povo que representam.
Poderemos esperar impactos na União Europeia decorrentes da instabilidade política francesa? Sim! A França é um dos pilares da União Europeia e qualquer instabilidade política no país terá, inevitavelmente, repercussões significativas. Juntamente com a Alemanha, a França desempenha um papel central na definição de políticas da União Europeia. A ausência de um governo estável em Paris enfraquece a capacidade da União Europeia no que diz respeito à resposta a desafios globais, como por exemplo, a guerra na Ucrânia. Ademais, França é um dos principais impulsionadores da política europeia de defesa, algo que é particularmente relevante num contexto de aumento das ameaças geopolíticas.
A queda do governo de Michel Barnier representa um momento crítico para a política francesa e europeia. Macron enfrenta a difícil tarefa de restaurar a governabilidade num contexto de fragmentação política e descontentamento social. As suas escolhas terão, como já vimos, implicações não apenas para o futuro de França, mas também para a estabilidade da União Europeia e para parceiros como Portugal. O sucesso de Macron está dependente da sua capacidade de construir consensos, implementar soluções pragmáticas e reconquistar a confiança pública.