Não é novidade para ninguém que a Madeira se encontra numa crise política profunda e estrutural. A situação atual expõe várias fragilidades do governo regional, bem como do sistema político insular. A moção de censura apresentada pelo Chega, apoiada pelo PS e pelo JPP, é o ponto de partida para esta análise.
De facto, a moção de censura que o Chega apresentou na Assembleia Legislativa Regional é catalisada por um conjunto, amplamente conhecido, de investigações judiciais que envolvem Miguel Albuquerque e membros do seu executivo. Apesar de o PSD ainda ser o maior partido na Madeira, a perda da maioria absoluta, em 2023, comprometeu a capacidade de governar de forma sólida, tendo essa governação sido claramente agravada por desentendimentos internos e um desgaste de décadas no que concerne ao exercício do poder.
Creio ser relevante fazer um breve enquadramento histórico. Desde o período de democratização da região, a Madeira foi governada exclusivamente pelo PSD, inicialmente sob a liderança carismática de Alberto João Jardim, que consolidou um sistema clientelista baseado, maioritariamente, em fundos europeus e apoio direto às populações. Esta hegemonia Jardinista moldou a política regional, dificultando o desenvolvimento de alternativas robustas. A prorrogação deste domínio Social Democrata levou à acomodação institucional, onde a oposição muitas vezes teve papéis marginais, sendo que as práticas governativas foram pouco desafiadas ao longo de décadas.
Se concentrarmos a nossa análise em Albuquerque, percebemos facilmente que, neste momento, o líder regional enfrenta duras críticas por não abdicar do cargo, apesar de uma imensa pressão política. Uma renúncia de Albuquerque, no contexto político regional poderia ser encarado como uma assunção de fraqueza, o que, por sua vez, em contexto eleitoral, poderia fragilizar ainda mais o PSD. Como tal, Albuquerque aposta na tentativa de gerar consensos parlamentares que evitem eleições antecipadas, em nome da estabilidade política regional, sabendo, de antemão, que novos pleitos poderiam beneficiar a oposição, em particular o PS e o Chega. O líder do executivo tenta equilibrar a manutenção e solidez do governo com as exigências de transparência, mas as investigações judiciais que tem sido alvo, colocam em xeque a credibilidade do seu executivo. Além disso, a aliança dos partidos da oposição reflete uma estratégia clara para enfraquecer o domínio histórico do PSD, aproveitando um descontentamento crescente na população.
Mas afinal, porque é que o PSD ainda é dominante, no cenário político regional? Mesmo diante de críticas, muitos eleitores madeirenses continuam a votar no PSD devido à memória de estabilidade e crescimento económico associados aos governos anteriores. A dependência de subsídios públicos e a ligação estreita entre o partido e as comunidades locais criaram uma relação simbiótica que, embora questionada, é difícil de romper. A permanência prolongada no poder, também tem efeitos negativos na qualidade da democracia. A falta de alternância limitou a inovação política, reduzindo a fiscalização efetiva e permitindo a perpetuação de práticas administrativas ultrapassadas. Este cenário reforça o argumento de que a alternância de poder é crucial para revitalizar a democracia e implementar reformas estruturais.
Que cenários estão em cima da mesa? O cenário mais evidente é o de eleições antecipadas. Este cenário beneficiaria a oposição, que procuraria mobilizar os descontentes com o PSD, contudo poderíamos ter como resultado um parlamento regional ainda mais fragmentado. Por outro lado, Albuquerque poderia tentar negociar um rearranjo dos acordos políticos, mas a legitimidade desse arranjo seria amplamente questionada. Aquela que me parece a solução mais eficaz, seria o afastamento de Albuquerque, para que se pudesse encontrar uma alternativa política, no PSD, de modo a reestruturar a liderança do partido e reconquistar a confiança do eleitorado. Um novo líder no PSD Madeira poderia distanciar-se dos escândalos que conhecemos e reposicionar o partido no panorama político regional. Assim, seria mais exequível para o PSD procurar estabelecer novos acordos de incidência parlamentar.
A Madeira enfrente, novamente, um momento decisivo, que pode redefinir politicamente a região. Embora o PSD tenha dominado historicamente, a pressão por mudanças pode alterar drasticamente o equilíbrio de poder. Seja como for, saibam os políticos regionais estar à altura do desafio que se avizinha.