A morte de Odair Moniz, jovem cabo-verdiano, sob circunstâncias cuja investigação ainda decorre, desencadeou uma forte resposta política e social em Portugal. Este acontecimento trouxe para o centro do debate questões sobre o racismo, a violência policial e desigualdades estruturais, refletindo uma situação evidente de polarização que se manifesta cada vez mais no discurso dos partidos políticos. De facto, a resposta foi rápida e intensa, dividindo líderes políticos, ativistas e a sociedade civil como um todo, quanto ao papel e forma de atuar das forças de segurança nacionais, bem como em torno da presença e da inclusão das comunidades afrodescendentes em Portugal.
Se olharmos para aquilo que foram as declarações mais destacadas entre os líderes políticos, o Bloco de Esquerda sublinhou que a morte de Odair Moniz representa um exemplo das desigualdades que as comunidades racializadas enfrentam no nosso país. Para o partido, este caso é reflexo do racismo estrutural que permeia várias instituições e que, na sua perspetiva, afeta de sobremaneira as minorias. Ao enfatizar que a discriminação sistemática não se limita a comportamentos isolados de um determinado indivíduo, o BE defende uma reforma com o intuito de enfrentar a marginalização e violência que, segundo o partido, impactam desproporcionalmente estas comunidades. De uma forma geral, quem defende esta posição, acredita que casos como o de Odair ilustram as dificuldades de convivência e igualdade num país que, apesar de multicultural, ainda exibe fragilidades no respeito pela diversidade.
Em perspetiva antagónica, o Chega abordou o caso com uma retórica orientada para a segurança, defendendo a ação policial como necessária para preservar a ordem pública. O líder do Chega, André Ventura, elogiou o agente envolvido e criticou a possibilidade de este ser constituído arguido, afirmando que ele deveria ser reconhecido pelo seu trabalho. Em declarações que foram marcadas pela controvérsia, o líder parlamentar do Chega, Pedro Pinto, sugeriu que uma ação policial mais enérgica garantiria mais segurança, uma afirmação que foi interpretada por muitos como uma incitação à violência e que levou à abertura de um inquérito pela Procuradoria-Geral da República.
A polarização gerada pelo caso de Odair Moniz evidencia o clima político atual em Portugal, onde os debates estão cada vez mais inflamados, tornando difícil encontrar consensos. Se olharmos para o contexto europeu, podemos argumentar que também além-fronteiras começa a existir cada vez mais um amplo debate acerca das temáticas da imigração e da identidade nacional. Este caso expõe as tensões entre a necessidade de segurança e o combate à discriminação, enaltecendo as fragilidades das instituições portuguesas nas relações com as minorias e desafiando o país a repensar a sua abordagem no que concerne à segurança nacional.
Na minha ótica, as abordagens do BE e do Chega foram-se tornando mais intensas à medida que a tragédia em análise é mobilizada para amplificar os discursos habituais destes partidos. Na política não vale tudo. Esta polarização, embora permita aos partidos galvanizar os seus eleitores, pode resultar num clima político instável, com riscos preocupantes para a coesão social. Não é tolerável que líderes políticos tenham discursos inflamados perante esta situação. Os representantes políticos têm de aprender a moderar-se e evitar o aproveitamento político de tragédias que fragilizam a sociedade e as instituições democráticas em Portugal.