A Associação Portuguesa de Bancos (APB) considera que os bancos “não têm tido muitos lucros”, porque é preciso avaliar a rentabilidade do capital, e que a dificuldade de acesso a crédito à habitação se deve a fatores externos aos bancos.
O presidente da Associação Portuguesa de Bancos (APB), Vítor Bento, falou com a Lusa a propósito da conferência que hoje assinala os 40 anos da APB (fundada em outubro de 1984), dedicada ao papel da banca no desenvolvimento económico e social, tendo o gestor destacando a importância da banca no acesso à habitação própria em Portugal.
“Se não fosse o crédito bancário, grande parte das famílias não tinha tido acesso à habitação. Estimo que cerca de dois terços das famílias em Portugal têm habitação da qual são proprietárias devido ao crédito bancário”, disse o presidente da APB, acrescentando que as taxas de juro deste crédito em Portugal foram, nos últimos 20 anos, mais baixas do que a média da zona euro.
Sobre as dificuldades sentidas por muitas famílias em acederem a crédito à habitação, Vítor Bento disse que isso se deve a fatores exógenos (preço das casas, rendimentos) e não por restrição dos bancos.
“O acesso é até bastante fácil. As dificuldades que as pessoas sentem são exteriores às condições do crédito, não têm dificuldade no acesso ao crédito naquilo que depende dos bancos. É do interesse dos bancos conceder o maior volume de crédito possível, desde que esse crédito seja seguro”, afirmou.
Quanto à garantia pública que o Estado prestará para jovens acederem ao crédito à habitação, que deverá estar operacional no final do ano, Vítor Bento considerou que a extensão do impacto da medida dependerá de várias variáveis, designadamente da adesão.
Sobre a posição do Banco de Portugal sobre esta medida, que tem alertado para cautela, disse compreender as duas perspetivas, a do Governo, que quer apoiar essa população, e a do Banco de Portugal, que quer assegurar a qualidade dos empréstimos e resiliência dos bancos, mas anteviu que serão “reconciliáveis”.
Ainda à Lusa, Vítor Bento rejeitou a ideia de que os bancos têm tido elevados lucros, afirmando que não se pode olhar só para lucros em valor absoluto e que “só em 2023 a rendibilidade do setor foi ligeiramente superior” à rendibilidade média das grandes empresas dos setores não financeiros.
“Na questão dos lucros, que é um tema muito falado, as coisas têm que ser vistas em perspetiva. Quem fala dos lucros está a ver os valores absolutos, mas não faz comparação com outros setores nem com o volume de capital que é necessário para gerar esses lucros. O setor da banca é, enquanto setor, o que mais capital tem aplicado na sua atividade, cerca de 40 mil milhões de euros”, referiu.
Os reguladores e supervisores bancários têm vindo a alertar os bancos para usarem parte dos atuais lucros para aumentar as ‘almofadas de capital’ e, assim, estarem mais bem preparados para futuras crises.
Questionado sobre se os bancos estão a distribuir lucros acima do que deveriam, Vítor Bento rejeitou essa ideia e recordou os elevados níveis de capital dos bancos portugueses.
Quanto à medida recentemente tomada pelo Banco de Portugal de obrigar os bancos ao reforço de ‘almofadas de capital’ (pela constituição de uma reserva contracíclica em 2026), o presidente da APB disse que do “ponto de vista estritamente financeiro é acomodável”, mas que “quanto mais capital ficar imobilizado nos bancos, mais os bancos precisam de ser mais rentáveis para conseguir atrair capital de investidores”, pelo que defendeu um equilíbrio.
“É esse equilíbrio que terá que ser procurado entre aquilo que é razoável na exigência dos rácios de capital e quanto é que é a rendibilidade necessária para assegurar essa sustentabilidade”, disse.
Vítor Bento considerou ainda que a banca é um setor com “excesso de fiscalidade”, afirmando que com isso “os bancos que criam emprego em Portugal têm desvantagem [competitiva] face aos bancos que criam emprego lá fora” ainda que operem em Portugal.
A proposta do Orçamento do Estado para 2025 mantém a contribuição sobre o setor bancário, estimando arrecadar 210 milhões de euros, e o imposto adicional de solidariedade, mais 40,8 milhões de euros. Há duas semanas, o Ministério Público pediu ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade deste imposto adicional, depois de três decisões do Tribunal Constitucional nesse sentido.
Para Vítor Bento, as decisões do Tribunal Constitucional sustentam a posição da APB “de que não há sustentação racional e razoável para a manutenção desse adicional que foi criado num momento muito especial, quando vivemos a pandemia”.
A proposta orçamental inclui ainda uma descida da taxa do IRC (imposto sobre lucro das empresas) dos atuais 21% para 20%, o que tem impacto sobretudo em grandes empresas como bancos.
A APB é a associação que representa as empresas do setor bancário. Foi criada em 17 de outubro de 1984 para defender os interesses dos seus associados, sendo seus sócios os principais bancos que operam em Portugal.
Dos bancos fundadores da APB, há 40 anos, vários já desapareceram, caso do Banco Espírito Santo (BES), ou foram comprados e fundidos noutros, caso do Banco Totta & Açores. Atualmente tem 26 sócios, incluindo Caixa Geral de Depósitos, BCP, Novo Banco, Santander, BPI, Montepio, Crédito Agrícola.
A APB assinala hoje os seus 40 anos com uma conferência em Lisboa sobre ‘O papel da banca no desenvolvimento económico-social’, que conta com a presença do ministro das Finanças, Miranda Sarmento.