Vinte anos após a classificação da paisagem da vinha do Pico como património da humanidade, o ex-governante açoriano Hélder Silva, que conduziu o processo, diz que esta foi uma aposta ganha, mas com peripécias.

Em declarações à agência Lusa, no dia em que se assinalam os 20 anos da classificação por parte da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO, na sigla em inglês), o então secretário regional do Ambiente do Governo dos Açores recorda que “houve efetivamente várias dificuldades”, apesar de esta ambição da ilha do Pico e do arquipélago “já vir de trás”.

A cultura da vinha da ilha do Pico foi classificada como paisagem protegida em 27 de junho de 1996 e em 02 de julho de 2004 foi aprovada pela UNESCO a sua inscrição como património mundial, na categoria de paisagem cultural.

Segundo Hélder Silva, o processo enfrentou dificuldades várias, inclusive o facto de “ao longo do tempo terem surgido na região outras intenções de classificação como património da humanidade”, como foi o caso da caldeira do Enxofre, na ilha Graciosa, e o Algar do Carvão, na Terceira.

A UNESCO, indica, tinha na altura cerca de 700 bens classificados e cerca de uma dezena era de Portugal, pelo que “era muito difícil para uma região submeter três candidaturas”.

Hélder Silva estava convencido de que “a única que tinha hipóteses era efetivamente o Pico”.

Ao longo de dois anos, a equipa da Secretaria Regional do Ambiente preparou a candidatura, que foi submetida à representação da UNESCO em Portugal em 2002 e apresentada para apreciação na assembleia geral do organismo, em Paris, no ano seguinte.

“Houve várias peripécias ao longo deste processo”, conta Hélder Silva, indicando, desde logo, “a mudança de governo”. Contudo, o projeto continuou, apesar dos rumores de que “seria muito difícil classificar o bem”, já que um grupo maioritário de países com assento na UNESCO entendia que já havia várias classificações em torno do vinho.

“Recebi, na altura, um telefonema a referir que não valia a pena ir para Paris porque a candidatura iria ser chumbada”, recorda.

O antigo secretário regional seguiu, ainda assim, para a capital francesa. A apresentação da candidatura “começou bem, com vários países a darem notas muito positivas”, mas o “tom alterou-se com um conjunto de intervenções demolidoras” para a intenção açoriana, com objeções, por exemplo, dos países árabes.

Determinante para as pretensões dos Açores foi, na altura, a intervenção do embaixador da Tailândia junto da UNESCO, que propôs alterações de melhoria à candidatura e uma nova submissão, em novembro de 2003.

Em 2004, em Suzhou, na China, a classificação foi viabilizada.

“Foi um momento de muita felicidade. Recordo a euforia que se viveu na comunicação social. Pessoas que nada tinham a ver com a região, do país, ficaram eufóricas com a classificação da paisagem da vinha do Pico como património da humanidade. Foi uma reação extraordinária por todo o país”, recorda Hélder Silva, que afirma ter metido a “cabeça no cepo” sem hesitar pelo projeto.

A atividade vitivinícola no Pico terá sido iniciada com a chegada dos povoadores à ilha no século XV. A paisagem da vinha ocupa uma área de 987 hectares, envolvida por uma zona tampão com 1.924 hectares.

É composta por uma faixa de território que abrange parcialmente as costas norte e sul, e a costa oeste da ilha, tendo como referência o Lajido da Criação Velha e o Lajido de Santa Luzia.

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