O número de exemplares de caracóis dos Açores sofreu uma grande diminuição nos últimos 50 anos e algumas espécies deixaram de ser vistas desde há 20 anos, em parte devido às alterações climáticas.
Esta é a conclusão do estudo “Os caracóis endémicos dos Açores estão a desaparecer. De quem é a culpa?, publicado em dezembro na revista de estudos “Açoreana”, da Sociedade Afonso Chaves, e agora divulgado pelo Instituto Português do Mar e da Atmosfera.
O estudo foi realizado pelo investigador e professor universitário António Frias Martins, pelo meteorologista Diamantino Henriques e pelo investigador e especialista na ecologia dos moluscos, Robert Cameron.
A investigação foi desenvolvida com base na Coleção de Referência do Departamento de Biologia da Universidade dos Açores (DBUAç-MT), que tem cerca de 50 anos de recolhas de moluscos terrestres.
“Por suspeitarmos que algumas espécies sistematicamente deixaram de aparecer, fizemos um estudo comparativo das abundâncias nas recolhas realizadas ao longo de cinco décadas. E verificou-se que, a partir de 2000, algumas espécies nunca mais foram encontradas e noutras notou-se um decréscimo terrível de exemplares recolhidos”, explicou hoje à agência Lusa Frias Martins.
O estudo surge na sequência do projeto LIFE SNAILS, que pretende restaurar o habitat na área protegida do Pico Alto, em Santa Maria, a mais rica em espécies endémicas de moluscos terrestres dos Açores.
Segundo o investigador, as preocupações em relação à extinção de certas espécies endémicas de moluscos na ilha de Santa Maria “já vêm desde há uns anos”.
Frias Martins, que é também consultor do projeto LIFE SNAILS, sublinhou que a conclusão do estudo revela um cenário “pouco famoso”, já que “existem algumas espécies que há 20 anos não se encontra um único exemplar”.
“Suspeitamos que ou estão dramaticamente em perigo de extinção ou já estão extintas”, apontou o também especialista em moluscos terrestres marinhos.
Os resultados sugerem que as alterações climáticas e a destruição do habitat, juntamente com a introdução de plantas e animais invasores, são responsáveis por tal desaparecimento.
“A fragmentação do habitat florestal antigo em pastagens nos Açores é outras das possibilidades das causas da extinção das espécies e a plantação da monocultura de criptoméria e a expansão por invasão do incenso e da conteira”, acrescentou.
De acordo com o investigador, estas pequenas alterações juntas criam “uma situação de ameaça considerável para os moluscos terrestres dos Açores”.
Por isso, e segundo Frias Martins, o projeto LIFE SNAILS, tenciona recuperar o coberto vegetal de uma parte da zona protegida do Pico Alto, em Santa Maria, e a substituição por outras que são endémicas, admitindo que se trata de um processo demorado.
“Estamos a fazê-lo. Vamos ter mais uma missão, dentro de duas semanas, com o objetivo de restaurar, na medida do possível, o habitat original e convidar os moluscos a irem para lá viver”, explicou ainda à Lusa.
O estudo foi feito sobretudo em Santa Maria, mas também foram abordados outros casos, em concreto, nomeadamente na ilha de São Miguel, o que permite ter a “indicação clara do tempo necessário para uma recuperação do habitat e das comunidades de moluscos”, referiu Frias Martins.