Eis uma qualidade ou virtude que há muito anda arredada da política açoriana. Sua Excelência o Presidente da República parece ignorar a crise política nos Açores. O seu Representante nestas ilhas adjacentes deverá dar uma prova de vida lá para o Natal num daqueles discursos com a mesma utilidade que uma viola num funeral. Os partidos que formam a coligação nem querem ouvir falar de demissão, nem tão pouco de uma moção de confiança. Os partidos que, estrategicamente, rasgaram os acordos parlamentares não viabilizarão o próximo orçamento, mas também, com quase total certeza, não votarão ao lado da esquerda radical a “bomba atómica”. Esta esquerda radical (BE), que até duvido que hoje em dia se autointitule como tal, ainda está escaldada com a consequência nas urnas do chumbo do Orçamento do Estado para 2022. E a esquerda moderada (PS) continua à espera dos amanhãs que cantam; com um discurso nos Açores e outro em Lisboa; muito forte na adjetivação e poucochinho na ação. Por vezes, tudo isto me faz recordar o jogador que pedia insistentemente a Deus para lhe sair a lotaria e que certo dia Deus lhe respondeu da seguinte forma: “ao menos faz a tua parte, joga!” Já todos percebemos que o dia de jogar está cada vez mais distante. Gostava de estar enganado. Gostava que houvesse uma clarificação. Para tal acontecer era preciso não ter medo da própria sombra. Estamos todos fartos de joguinhos de palavras, de ameaças vãs e de estarem permanentemente a olhar uns para os outros.
Esta minha crítica, sendo generalizada, é muito mais dirigida a quem (alegadamente) quer derrubar o governo e, em consequência, devolver a palavra ao sábio Povo. Não é ao Governo que compete esta missão. A bola está no outro campo. A iniciativa tem que ter origem nos partidos com acesso regimental à moção de censura. Dizer o contrário é atirar areia para os olhos dos Açorianos. A “jogada” pode correr mal? Não vejo como! Isto mesmo sendo da opinião que já virá tarde e não por exclusiva vontade própria. Se a moção for aprovada, o Povo dará a sentença. Seja ela qual for. Se for rejeitada, ficam dissipadas as dúvidas quanto à massa de que são feitos determinados Deputados. Limpinho, limpinho, como diria o Jorge Jesus. Alguma dúvida? Continuar nisto até setembro ou outubro de 2024 é que é incompreensível. Mas até não me admira que seja essa a opção. Tal como não me espanta que o BE e o PS apresentem diversas propostas de alteração a um orçamento que já anunciaram o seu voto contra. E se a coligação aceitar todas ou pelo menos a maioria dessas propostas? Haverá coragem para mudar o sentido de voto ou, como em anos anteriores, votarão contra as suas próprias propostas? Parece mentira, mas não é. E até, ironicamente, é outra forma de coragem. Aquela “coragem” cuja definição é “acto ou efeito de corar”!